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Como esquecer Marcelo Manaia e o sargento do Tiro de Guerra?

Esperava vencer, afinal, como disse meu neto Pedro, de 15 anos: “Vô, você construiu isso dia a dia ao longo de sua vida.” Tão diferente daqueles que chegam e me dizem: “Deixe-me apertar sua mão, para ver se  consigo um pouco da sua sorte.” Sorte?  Igual a outros que me perguntam, aqui mesmo na cidade: “Você não trabalha mais, só escreve?” Relevo,  rio, porque isso mostra a falta de cultura provocada por um ensino mambembe, vagabundo, de quinta categoria, que forma alunos que na sétima série não sabem fazer contas.

Voltemos  a um belo momento de minha vida, a eleição para a Academia Brasileira de Letras, vencida por unanimidade na quinta-feira dia 14. Aos que desdenham dizendo que os outros candidatos eram despreziveis, não tinham obra, respondo que não desdenho ninguém. Também não conhecia nenhuma deles. Só não sabem e que no momento em que me candidatei, intelectuais do porte de Silviano Santiago, professor universitário, ensaísta, crítico e autor de belissimo romance sobre Machado de Assis retirou sua candidatura. Também Rubens Ricupero,  diplomata de carreira, assessor internacional do presidente eleito Tancredo Neves, representante permanente do Brasil junto aos órgãos da ONU sediados em Genebra e embaixador nos Estados Unidos , saiu discretamente de cena.  Senti-me homenageado por eles, ambos amigos de longa data.

Na ultima quinta-feira, dia 21, fui à Academia no Rio de Janeiro. Discuti com o presidente Marcho Lucchesi detalhes da posse no dia 18 de outubro e fui convidado  para a reunião. Em torno de mim,  entre outros, bons amigos como Nelida Piñon, Antonio Torres, Cicero Sandroni, Zuenir Ventura, Arnaldo Niskier (conheço desde os tempos da Manchete, da Fatos & Fotos, ambos trabalhamos para os Bloch); Rosiska Darcy, que foi braço direito de Ruth Cardoso e me auxiliou na biografia de nossa primeira dama; Sergio Paulo Rouanet, o da lei, que conheci na Alemanha, e Evanildo Bechara que teve  uma araraquarense como aluna dileta, Maria Helena de Moura Neves.

Esta minha cadidatura capitaneada por Celso Lafer, Torres, FHC, Rosiska e Cicero foi produto de anos de relações e trabalho e construção de obra.  Por cinco vezes recusei ser candidato. De repente, vi chegada a hora, aqui estou. É uma “imortalidade que devo a Lourdes Prada e a Ruth Segnini, minhas primeiras professoras, ao meu pai que me conduziu nas leituras, ao meu grupo no Clube do Rum, Hugo Fortes, Dedão (Raphael L. J. Thomaz) Fenerich,  José Eduard de Almeida, Marco Antonio Rocha,  Sydney Sanchez, Zé Celso,  Padua, Geraldo Machado, ao Wallace Leal e ao TECA, a professores como Ulisses Ribeiro, Cidinha Valério (“Você tem poder de síntese, use”, me dizia) , Machadinho, Jurandir Gonçalves ( que aconselhava: “Cuidado com o lhe, pode estragar uma frase), com o Walter M. Mauro,  que tinha um mantra: “Decorar não é aprender, tem de entender”. Ao Roberto Affonso que me ampliou a paixão pelo cinema. Longa lista, faltam vários Foi como pavimentar uma calça com pedrinhas portuguesas. Sem esquecer o sargento William, do Tiro de Guerra, que me deixava faltar, me “esquecia” no escritório lendo e escrevendo, dizendo: “hoje está chovendo, fica ai no quentinho”. Ou “Esqueça essa marcha noturna de 20 quilômetros, vá ao cinema, afinal você é o crítico”. Finalmente ao Marcelo Manaia que me deixava usar a máquina de escrever da biblioteca, o papel do municipio, me deixava levar livros e entregá-los quando eu quisesse e que, libertário,  abriu a gaveta onde estavam fechadoo os livros de Jorge Amado, “proibidos para a mulheres.” Vivi e vivo uma bela vida, só fiz e faço o que gosto, acerto e erro, mas sou feliz.

 

 

Redação

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