Luís Carlos Bedran*
O carnaval chegou. Ainda bem, porque faltava um pouco de alegria no País, com esse ódio político que se espalhou entre os brasileiros, de norte a sul, de leste a oeste e que se espera que isso não mais ocorra. E que neste 2024 talvez haja um recrudescimento nas eleições municipais. Mas e os pré-carnavalescos, não valem nada?
Claro que valem, mas são aperitivos até chegar aos dias principais e talvez terminar na quarta-feira de cinzas. Talvez, porque como de costume nalguns lugares, ele continuará fervendo.
Os preparativos das escolas de samba começaram logo que acabou o carnaval do ano passado, é um planejamento quase que científico, embora seja artístico. Como a escola da Mocidade Alegre no Rio de Janeiro, cujo tema é Mário de Andrade, aquele cara que escreveu em Araraquara sua principal obra, Macunaíma.
Mas o tema não é somente ele. Pelo que percebi, dentro das limitações do
conhecimento deste caipira-pirapora, do interior de São Paulo, a homenagem a um escritor paulistano, talvez o maior incentivador da Semana Moderna de 1922 vai além, depois de tanto tempo e, merecidamente, resgatar a figura do negro, a negritude.
Assim o povo brasileiro, constituído de mais de 60% de pardos, incluído os
pretos, ficará sabendo quem ele foi, o que ele fez para a cultura brasileira. Porque também ele era de ascendência negra, muito embora não se assumia ante o espírito da época, tanto que as fotos antigas eram branqueadas para sua aparência parecer branca, assim como Machado de Assis, no século 19, considerado o maior escritor que o país já teve.
Mas o carnaval é invenção recente dos europeus, como o de Veneza, que foi trazido ao Brasil desde o Império e logo assimilado pelo povo, a ponto até de se dizer que nós somos o verdadeiro país do carnaval, considerado no mundo todo, porque ele se transformou quase que completamente, saindo dos salões da nobreza, dos clubes restritos, dos brancos, para ir às ruas, com a inclusão das características étnicas que nos formam.
Como o espírito lúdico dos passistas, dos sambas enredo, que com as alegorias das imensas escolas de samba nas capitais e grandes cidades, revela bastante a nossa formação, essa miscigenação que vivifica o povo brasileiro e que é louvado pelos artistas, poetas e escritores em todos os tempos.
São os dias do esquecimento, da loucura, da farra, da catarse, do amor, da
paixão, do sexo. Como retrata o Orfeu do Carnaval, filme baseado na obra teatral de Orfeu da Conceição, de Vinícius de Morais e música de Antônio Carlos Jobim; como louva Manuel Bandeira em “Bacanal”: “Quero beber! cantar asneiras / No esto brutal das bebedeiras / Que tudo emborca e faz em caco… Evoé Baco!”.
O carnaval das capitais, os desfiles bancados pelos bicheiros na antiga capital federal é para turistas. Mas o autêntico está nas cidades pequenas do interior. E que continue!
*Sociólogo, advogado, jornalista, ex-vice-presidente da OAB/Araraquara, foi procurador do Estado de São Paulo