O Ministério Público Federal decidiu pelo arquivamento do inquérito que apurava o processo de licitação para compra dos respiradores por parte da Secretaria Municipal de Saúde em 2020, no auge da pandemia da Covid-19, durante a gestão do ex-prefeito Edinho e da secretária municipal Eliana Honain.
No relatório do processo, emitido em 13 de maio de 2025, o Procurador da República, José Rubens Plates, afirma que não houve qualquer indício de irregularidade no ato da compra dos equipamentos. “Não há, nos autos, qualquer elemento probatório que evidencie a intenção deliberada de fraudar ou frustrar o caráter competitivo do procedimento licitatório, tampouco de beneficiar terceiros ou de causar dano ao erário”, diz um trecho do relatório.
O Procurador também deixou claro, em seu relatório, o entendimento sobre a necessidade urgente da gestão pública municipal na compra dos respiradores com objetivo de salvar vidas durante o auge da pandemia que vitimou milhões de pessoas no Brasil. “Contudo, cumpre observar que não houve contratação fora das hipóteses legais de dispensa. A situação emergencial vivida no início da pandemia justifica a adoção do regime excepcional, dada a necessidade de pronta resposta do poder público à crise sanitária e à urgência da aquisição de bens ou serviços essenciais à preservação da vida de milhares de pacientes. O que se verificou foi, exclusivamente, a inobservância de formalidades procedimentais. Com a revogação do art. 89 da Lei nº 8.666/1993, e diante da ausência de reprodução da segunda parte do referido dispositivo – “deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa” – na nova redação prevista no art. 337-E do Código Penal, não há que se falar em cometimento de crime em razão da mera inobservância das formalidades legais para a instrução do processo de contratação por dispensa de licitação. Tal conduta configura abolitio criminis em relação aos fatos pretéritos, e atipicidade formal quanto às condutas praticadas sob a égide da nova legislação”.
Mais vitórias
A decisão do MPF corrobora com outras decisões vitoriosas acerca do mesmo tema como a do TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) que, em sessão de 16 de abril de 2025, acolheu os recursos interpostos por Eliana, Edinho e pelo município, reconhecendo que, apesar de falhas formais na contratação emergencial, as providências administrativas adotadas foram eficazes na reversão integral dos danos ao erário.
“Trata-se aqui de uma contratação de abril de 2020, momento extremamente delicado da pandemia de COVID-19, em que o gestor foi convocado a tomar medidas urgentes no cenário de preços imprevisíveis e de difícil comparação. Quando as ofertas eram escassas e as empresas que detinham produtos essenciais eram muitas vezes importadoras desconhecidas no mercado. Ao tomar uma decisão urgente, o gestor via ciência em situação de assumir o risco de cometer eventuais erros na contratação, para não os cometer na vida da sua população. Com a obrigação evidente de em caso de falhas no contrato realizar todos os esforços necessários para a recomposição do erário. Trata-se exatamente do caso em tela. A ausência de entrega dos respiradores pela contratada não comprometeu o conjunto de medidas tomadas para o enfrentamento da pandemia no Ministério de Araraquara, que apresentou o número de óbitos substancialmente abaixo dos municípios de porte similar, conforme o quadro comparativo que trago no corpo do meu voto. E o prejuízo financeiro, como já evidenciado, foi completamente revertido, tendo o município perseguido até o fim em seu direito de reaver os valores que haviam sido exigidos e pagos em antecipação pelos ventiladores pulmonares. Diante de tal cenário, considerando ainda o artigo 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, penso que a matéria comporta provimento integral. É o voto “, declarou o Conselheiro Maxwell Borges de Moura Vieira.
O conselheiro Renato Martins Costa, no mesmo processo, ainda fez elogios aos gestores municipais pela rápida ação no ressarcimento dos recursos. “Minha intervenção é para registrar uma menção de elogio à ação administrativa da prefeitura de Araraquara, porque a gente está cansado de ver situações assemelhadas em que os prefeitos não tomam providências para ir atrás da composição do prejuízo. E o município, ou mesmo a Secretaria da Saúde de Estado de São Paulo, acabam absorvendo esses gastos sem qualquer movimentação no sentido de ir atrás desses aventureiros irresponsáveis que jogaram com a vida alheia, com esse descaso. Eu gostaria de manifestar publicamente os meus cumprimentos ao prefeito Edinho Silva e toda a sua equipe pelas providências adotadas”.
Valor 100% no caixa da Prefeitura com juros e correções
A partir de uma homologação de acordo em julho de 2024 na Vara da Fazenda Pública de Araraquara, Edinho e Eliana, por meio da Procuradoria Geral do Município à época, conseguiram a devolução aos cofres públicos da totalidade dos valores destinados em 2020 à compra dos respiradores, inclusive com juros e atualizações. O acordou garantiu a devolução aos cofres públicos de R$ 1.367.777,94 que ainda faltavam ser ressarcidos do negócio feito em abril de 2020 com a importadora R.Y. Top Brasil Ltda.
O município já tinha recuperado, dos R$ 1.049.687,50 pagos à empresa de entrada da compra, um total de R$ 653.922,21 que a PGM conseguiu bloquear e receber durante o longo período de batalha judicial. Foram R$ 526.774,49 ressarcidos em julho de 2020, mais R$ 22.175,29 em julho de 2022, mais R$ 74.972,43 em abril de 2024 e mais R$ 30 mil em junho de 2024. E, finalmente, até o final de 2024 (dezembro), entraram nos cofres públicos, mais R$ 1.367.777,94 restantes.
Saúde agiu de forma rápida, legal e responsável para salvar vidas, diz Eliana
Para Eliana Honain, ex-secretária de Saúde, a decisão do MPF reforça e vai ao encontro de todos os demais processos, comprovando que a Secretaria agiu com boa-fé e legalmente na tentativa de compra dos equipamentos com objetivo de garantir estrutura para o atendimento aos pacientes acometidos pela Covid-19. “Todos nós agimos na conformidade da lei, na urgência que era necessária para que pudéssemos cuidar da melhor forma dos pacientes. Não à toa Araraquara se destacou no Brasil e no mundo como uma referência no enfrentamento à pandemia, tendo aqui, uma das menores letalidades registradas. Nós agimos de forma séria, rápida e responsável. Eu faria tudo novamente se preciso fosse porque sei que o nosso trabalho salvou muitas vidas”, afirmou Eliana.
Segundo ela, o processo de tentativa de compra de respiradores eletrônicos para UTI, seguiu todos os parâmetros da legislação vigente à época e, imediatamente após a empresa vencedora no processo de compras descumprir o negócio, a Prefeitura acionou a Justiça e entregou toda a documentação, de forma espontânea, ao Ministério Público.
Fim às fake news, destaca Edinho
O prefeito Edinho também comemorou a decisão e considera um ponto final nas muitas fake news criadas ao longo deste tempo a respeito do tema. “A Prefeitura tentou comprar respiradores com o objetivo de salvar vidas. E salvamos com a estrutura que montamos em tempo recorde no Hospital de Campanha e também no polo de referência na UPA da Vila Xavier. Na época, o mundo precisava de respiradores de UTI intensiva e a demanda era muito grande. Nossos servidores públicos da área de compras fizeram uma cotação e compramos da empresa que apresentou o menor preço. Os respiradores não chegaram e nós acionamos o Ministério Público, de forma totalmente transparente, sem nenhuma ilegalidade. Mesmo assim, grupos inconformados com o fato de Araraquara ter sido uma referência nacional e internacional no combate à pandemia da Covid-19 fizeram uso político e disseminaram muitas fake news. Quanto mais os órgãos de controle investigam os respiradores, mais se confirma que agimos com a coragem e velocidade que a gravidade da questão exigia. Lutamos muito na pandemia e superamos todos os desafios, inclusive este”, declarou o prefeito Edinho.
Edinho enfatizou também que, somente em recursos próprios, a Prefeitura de Araraquara investiu R$ 122 milhões no enfrentamento da pandemia, tendo como principal objetivo valorizar a vida, seguindo a ciência e a medicina.
Na época da tentativa de compra desses respiradores, Araraquara já tinha 13 respiradores eletrônicos de UTI na rede municipal de urgência e emergência. Outros 30 respiradores mecânicos, para casos mais leves do coronavírus, foram adquiridos da empresa araraquarense Essence Dental, a um preço de R$ 4 mil cada. Toda a estrutura montada em tempo recorde pela Prefeitura, incluindo o Hospital de Campanha, cumpriu plenamente seu objetivo de salvar vidas da população de Araraquara, da região e até de pacientes de outros Estados que foram transferidos para a cidade por falta de leitos em seus municípios.
E encerrado o período crítico da pandemia, todos os equipamentos adquiridos, incluindo camas, monitores e respiradores, foram remanejados para os hospitais da cidade, além da Unidade de Retaguarda do Melhado e UPAS, ou seja, continuaram atendendo a população.
Entenda o caso
Em abril de 2020, com aumento de casos de Covid e diante da necessidade de compra dos respiradores, sob o risco do colapso no sistema de saúde, servidores de carreira do setor de Compras da Prefeitura enviaram pedidos de orçamentos para mais de 100 emails de empresas que trabalham com importação. A tomada de preços foi feita apesar da ausência de necessidade de processo licitatório, com base no decreto municipal de calamidade pública que acompanhava decreto estadual e federal. De todas as empresas procuradas na tomada de preços, cinco responderam com os valores. O maior preço apresentado foi de R$ 273 mil por cada respirador, o que somaria R$ 6,8 milhões no total do contrato.
Em 13 de abril, foi declarada vencedora a empresa R.Y. Top Brasil Ltda., que apresentou o menor valor e cobrou R$ 167,9 mil por respirador — custo total de quase R$ 4,2 milhões. A Prefeitura precisou dar de entrada R$ 1.049.687,50, 25% do total, com base no decreto municipal 12.236, artigo 6º, com o restante a ser pago no recebimento dos equipamentos hospitalares, conforme prevê o decreto.

Porém, no final do mês, a empresa entrou em contato para afirmar que estava com dificuldades para importar os respiradores da China e entregar para Araraquara e se comprometeu a devolver para a Prefeitura os recursos que já tinham sido pagos. O cancelamento da compra foi publicado no dia 30 de abril e toda a documentação do processo foi entregue ao Ministério Público.
Depois disso, teve início a batalha judicial para o ressarcimento dos valores e a Prefeitura tomou todas as providências legais possíveis, com reconhecimento do Poder Judiciário, que sempre deu todo o provimento às iniciativas do município. A empresa teve imóveis penhorados e seus acionistas tiveram bens e passaportes bloqueados pela Justiça. Em quatro decisões judiciais diferentes, a Prefeitura conseguiu reaver R$ 653.922,21 dos 1.049.687,50 pagos.
Todo o processo foi feito de forma documentada, até a homologação do acordo de pagamento dos R$ 1.367.777,94 em julho de 2024, na Vara da Fazenda Pública de Araraquara.