Sônia Cristina Fonseca Cassoli/Colaboração
Já passavam das 16 horas, do dia 24 de outubro de 1930, dentro de uma casa, na Rua Carvalho Filho, no número 701, no centro de Araraquara, estado de São Paulo e uma parturiente estava a sofrer por não conseguir dar à luz, desde a madrugada. As dores, o desespero e o sufoco eram enormes. Horas a fazer força, sem resultado algum. A criança não havia feito o movimento natural para sair do ventre da mãe, sem dificuldade. Ela permanecia sentada, dentro do aconchegante útero materno. A mulher estava a perder as forças, sua vida e de seu bebê corriam risco e, num gesto de desespero e de último esforço, ela levantou-se da cama e, num impulso, ergueu a máquina de costura pesada, que encontrava-se dentro do quarto. Com esse gesto, moveu seu pequeno à vida.
Enquanto isso, neste mesmo dia, no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, o presidente Washington Luis estava deposto do seu cargo de presidente da República, devido a um golpe de Estado entre políticos e poderosos da Paraíba, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Dias depois, em 27 de outubro, o gaúcho Getúlio Dornelles Vargas, tornava-se presidente do país que, em alguns cantos, fervia devido a grande novidade.
Neste mesmo dia, o bebezinho nascido no último dia 24, em Araraquara, era registrado como Getúlio Vargas Cassoli, filho de Salvador Cassoli e Maria Taveira Marques. Uma homenagem ao mais novo presidente do país, talvez, não por convicções políticas, mas simplesmente por Salvador ser do contra, pois nem era naturalizado como brasileiro. Era italiano e nunca havia pisado na Itália e era cigano, não tendo raízes e tradições ligadas a uma pátria.
Dos filhos que sobreviveram à idade adulta, Getúlio era o quinto, sendo Oswaldo o mais velho, seguido por Isaura, Edgard, Haydée, Dalce e Neyde. A caçula é a única filha viva do casal Salvador e Maria e mora, atualmente, em Campinas. Logo, o menino mostrou-se o mais arteiro, mas com uma generosidade enorme, mostrando-se caridoso com todos aqueles que lhe pediam ajuda.
Getúlio gostava de brincar, jogar bola, subir em árvores, comer frutas dos pés, nadar e passear despreocupado. Foi até o fim da vida hiperativo e na escola e na vida encontrou dificuldades por seu modo de ser. Estudou no Externato São Bom Jesus e no grupo escolar Carlos Baptista Magalhães, ambos em Araraquara, no Externato São João, em Campinas, no Seminário Bom Jesus, em Aparecida do Norte e na Escola Profissional Ferroviária de Araraquara.
A grande paixão de Getúlio até a sua morte foi a bicicleta. Quando jovem foi ciclista e integrou a equipe de ciclistas de Araraquara, como “resistência”, chegando a competir em diversas corridas. Foi grande amigo do famoso velocista Argenton, com quem treinava nas antigas estradas de terra da região.
O pai e os irmãos foram ferroviários e ele chegou a trabalhar na ferrovia, mas abandonou para exercer a profissão que sempre amou: a mecânica de autos. Bem jovenzinho trabalhou na oficina do Pinguim, da família Pregnolato, na oficina de Ernesto Rebuglio, na Arauto, antiga concessionária da Volkswagen e foi encarregado da oficina mecânica dos caminhões da Usina Maringá. Na década de 70, ele e demais funcionários participaram da transição do antigo barracão localizado na avenida Janazi Biagioni, para uma área apropriada dentro da usina, pois a cidade não comportava mais receber veículos pesados na região central. Ele teve suas próprias oficinas mecânicas, sendo a última a Oficina Mecânica Nossa Senhora das Graças. Depois de aposentado, trabalhou na metalúrgica Calmeara, em Américo Brasiliense, na loja de matérias para escritório Mercúrio e até quase os 80 anos de idade, na portaria do Condomínio Edifício Caixa Econômica do Estado de São Paulo.
Parou de trabalhar fora para dedicar-se, exclusivamente, a cuidar de sua mulher, com Mal de Alzheimer, Wanda Fonseca Cassoli, com quem havia se casado, em dezembro de 1962. Ambos tiveram uma única filha, Sônia Cristina Fonseca Cassoli, moradora de Araraquara e servidora pública do Departamento Autônomo de Água e Esgotos (Daae).
Continuou a trabalhar incansavelmente, tendo reformado sozinho a sua casa. Getúlio caiu de uma parreira de uvas, ao colocar a última telha no telhado que havia reestruturado. Ficou hospitalizado por dez dias e faleceu em 28 de julho de 2018, aos 87 anos, em decorrência de uma embolia pulmonar. Foi enterrado no dia 29 de julho, no cemitério Parque dos Lírios, onde recebeu palmas dos presentes, reconhecimento de uma vida plena de generosidade aos semelhantes e de dedicação à família.
Getúlio Vargas Cassoli tinha um grande orgulho de seu nome, era admirador do presidente homônimo. Dizia que sua vida foi marcada pelos altos e baixos da carreira do político gaúcho. “Quando Getúlio estava bem, tudo bem; mas quando ele estava em baixa, as pessoas chegavam a ironizar e caçoar do meu nome. E podem falar o que quiserem, nenhum presidente brasileiro foi igual a ele”, dizia.