(*) Walter Miranda
LEI 3.353, de 13 de maio de 1888.
A Princesa Imperial Regente, em nome da sua majestade, o Imperador,
o senhor D. II, faz saber a todos os súditos do Império que a
Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:
Art. 1º- É declarada extinta, desde a data desta Lei, a escravidão no Brasil.
Art. 2º- Revogam-se as disposições em contrário.
Princesa Imperial Regente
No dia 13 de maio, em virtude da proclamação da lei citada, comemorou-se 130
anos da abolição da escravatura no Brasil. Esta história tem sido contada nos livros de
história oficial como sendo a data em que a princesa imperial, regente Isabel Cristina
Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Orleans e Bragança, conhecida
como Princesa Isabel, preocupada com a exploração e a discriminação dos negros no
Brasil, resolveu libertá-los.
Quando cursei o primário era exatamente essa a história oficial que me ensinaram as
adoráveis professoras. Como os fatos foram apresentados por uma elite intelectual, pessoas
que não viviam nos Quilombos e nas Senzalas, e que sofriam forte influência política dos
donos do poder, descreveram um conto de fadas sem qualquer ameaças de lobos maus.
Ao frequentar cursos de graduação e pós-graduação em grandes centros, conheci
livros e artigos de escritores negros, dentre eles Abdias do Nascimento, Mílton Santos,
Solano Trindade, Adão Ventura e outros. Deparei-me com as lutas de grandes personagens
como Lima Barreto, José do Patrocínio, João Cândido, Rutá de Souza e o principalmente
Zumbi de Palmares. Então, passei a ver a história com o olhar dos oprimidos, ou seja,
entender que a história fantasiosa contada à população nos bancos escolares ocultava
inteiramente o que se vivia nas Senzalas e nos Quilombos.
Na convivência com meus antepassados conheci, na prática, a verdadeira história da
escravidão, em especial com minha avó materna, a negra Norberta Rodrigues. A
denominada “Lei Áurea” foi promulgada, mas não promoveu a Reforma Agrária para
garantir a propriedade de terras, principalmente as dos Quilombos que abrigavam milhares
de afrodescendentes. Houve, portanto, uma falsa liberdade, com reflexos nas condições
sociais em que vivem milhões de negros atualmente.
Ainda vemos afro-brasileiros necessitando de políticas de ações afirmativas para
reparações das feridas sociais deixadas pelos mais de 300 anos de escravidão. A ideia da
abolição não concluída se reflete nas condições de escravidão com trabalhos inóspitos e
mal remunerados. A letra do Samba “Cem Anos de Liberdade Realidade ou Ilusão”,
composto por Hélio Turco, Jurandir e Alvinho para a Escola de Samba Estação Primeira da
Mangueira, campeã do carnaval do ano de 1988, num dos versos os poetas afirmam: “livres
do açoite da Senzala, mas permanecem presos na miséria da favela”.
A escravidão não é cristã. A prática era normal entre os hebreus, gregos e romanos.
A Bíblia nos revela, em diversas passagens, a exploração do trabalho de seres humanos nas
condições de escravos ou servos. A epístola ou carta do apóstolo Paulo a Filemon, senhor
de escravos, pedindo a libertação de Onésimo, é uma das passagens que comprovam esta
forma desumana da exploração do trabalho.
Quando a lei foi assinada, somente uma minoria constituída por idosos e doentes
sem condições de fugas, estavam nas Senzalas. Os mais fortes e os jovens haviam fugido
ou conquistaram a liberdade por meio de cartas de alforria, passando a viver nos Quilombos
ou nas periferias das cidades.
Assim, eu acompanho as críticas de estudiosos e militantes dos movimentos negros
à celebração do 13 de maio como o dia do fim da escravatura no Brasil. A verdadeira
liberdade foi conquistada por meio das lutas iniciadas por Zumbi de Palmares, assassinado
no dia 20 de novembro de 1695.
No dia 20 de novembro comemora-se o Dia Nacional da Consciência Negra, mas o
dia 13 de maio, pelas razões aqui expostas, não é reconhecido entre os negros como o
verdadeiro dia do fim da escravidão no Brasil. Infelizmente, a população negra não tem
seus plenos direitos respeitados. Assim, completamos 130 anos de abolição legal da
escravatura no Brasil sem reparações dos direitos retirados da população negra.
(*) WALTER MIRANDA é Presidente do Sindifisco Nacional – Sindicato dos Auditores-
Fiscais da Receita Federal/Delegacia Sindical em Araraquara, Pós-graduado em Ciência
Contábeis pela PUC/SP, militante da CSP-CONLUTAS-Central Sindical e Popular