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50 anos de AI-5

 

Dr. Marcos da Costa

 

Neste 13 de dezembro de 2018, o Brasil tem o doloroso dever de registrar o aniversário de 50 anos de um dos mais abomináveis atos de sua história: a edição do Ato Institucional nº 5, que foi seguido por mais 12 atos institucionais, 59 atos complementares e oito emendas constitucionais.

A partir daquele momento, a ditadura militar sepultava de vez a liberdade, excluía a Justiça de nosso convívio, determinava a tortura e a censura e nos colocava ombro a ombro com as mais intoleráveis tiranias do mundo. Enfim, decretava o fim da democracia no Brasil.

Com aquele ato, o governo se atribuía os seguintes poderes: cassar os mandatos legislativos, executivos, federais, estaduais e municipais; suspender os direitos políticos dos cidadãos, demitir, remover, aposentar funcionários civis e militares; demitir e remover juízes; decretar estado de sítio sem restrições ao país; confiscar bens para punir a corrupção; legislar por decreto e baixar outros atos institucionais completares; retirar o direito a habeas corpus (liberdade provisória enquanto responde ao processo) aos acusados de crimes contra a segurança nacional; transferir o julgamento de acusados para tribunais militares sem direito a recorrer.

No mesmo dia, o presidente Arthur da Costa e Silva fechou o Congresso Nacional, as assembleias legislativas e as câmaras municipais. Com extrema violência, o país afundou na escuridão. Os horizontes da democracia foram lacrados com a chave pesada da ditadura militar. Fechava-se o universo da locução. Calava-se qualquer manifestação de natureza política. Descortinava-se naquele fatídico mês de dezembro uma era sombria que acabou por deixar sua terrível marca: cerca de 20 mil brasileiros submetidos à tortura, 434 cidadãos mortos ou dados desaparecidos, 7 mil exilados e 800 julgados como presos políticos.

A Ordem dos Advogados do Brasil teve participação corajosa e decisiva para derrubar aquele malsinado ato. Em julho de 1977, em reunião na capital paulista, com a presença do então presidente da Secional paulista, Cid Vieira de Souza, e o presidente nacional da OAB, Raymundo Faoro, lançou-se a Carta de São Paulo, denunciando violação de direitos humanos, clamando por um Judiciário independente e pela volta do habeas corpus e indicando a pacificação social como caminho indispensável para a redemocratização do país.

Em 8 de agosto de 1977, o professor Goffredo da Silva Telles Jr, nas arcadas da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, leu a Carta aos Brasileiros, um libelo repudiando a ditadura, endossada pela OAB SP e assinada por diversos advogados.

No início de 1978, Jimmy Carter, presidente norte-americano, conhecido por sua preocupação com os direitos humanos, se reúne com personalidades, como o cardeal dom Paulo Evaristo Arns, de São Paulo, e Raymundo Faoro, cuja valorosa expressão destacava que só a ordem jurídica democrática poderia abater o autoritarismo. Em maio daquele mesmo ano, realizou-se em Curitiba a VII Conferência Nacional da Advocacia, debatendo o tema central O Estado de Direito. Na oportunidade, o presidente Faoro, por intermédio do senador Petrônio Portela e do ministro e representante do presidente da República, Rafael Mayer, recebe comunicação do general Ernesto Geisel, tratando do restabelecimento do habeas corpus, da decretação da anistia e do encaminhamento da lei assegurando a independência ao Poder Judiciário, que, em 1979, se tornaria a Lei Orgânica da Magistratura, LOMAN.

AI-5 vigorou até dezembro de 1978, e a emenda que o aboliu entrou em vigor em 1 de janeiro de 1979, dando início à “política de abertura”, quando o país começou a retirar a mordaça que o sufocava sob a sombra da censura, do medo e da opressão.

Ao completar o 50º aniversário do AI-5, urge reavivar a memória nacional, relembrando a era das trevas e os malefícios que acarretou à alma nacional. São incomensuráveis os danos provocados na coletividade. Sem os direitos fundamentais às liberdades – direito de expressão, da manifestação, de associação, entre outros –, quebram-se os pilares do edifício da cidadania, deixando sequelas no corpo social, destruindo os valores que abrigam o escopo das liberdades, da Justiça e do Direito.

Somos uma Nação que cultiva as liberdades. O nosso povo, mesmo com sua índole pacífica, criativa e ordeira, fruto da miscigenação de raças, sempre esteve presente com seu fervor cívico por ocasião dos movimentos sociais nos ciclos do Brasil Colônia, do Brasil Império e do Brasil República, cuja contemporaneidade registra atos de luta pelos direitos, como o Movimento Diretas-Já, nos idos de 1983/1984.

Somos hoje uma democracia em fase de consolidação de suas instituições. Temos a satisfação de constatar que o país possui uma das mais democráticas constituições do nosso planeta, a Constituição Federal de 1988, que estabelece igualdade entre os cidadãos, sob o selo de direitos individuais e coletivos que nos livram dos sistemas de opressão dos regimes autoritários.

Redação

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