A 33ª Bienal de Arte de São Paulo tem artistas que nos obrigam a repensar o cotidiano. Talvez o principal deles seja o guatelmateco Aníbal López (1964 – 2014), que assina parte de seus trabalhos como A-1 53167, número de seu documento de identidade. Era uma forma de questionar nossa posição no mundo apenas como seres anônimos de um grande sistema.
Suas performances de cunho político eram sempre ousadas e espantosamente atuais. Talvez a mais melancólica pela sua relevância contemporânea é a ação chamada ‘El préstamo’ (‘O empréstimo’), texto autobiográfico em que narra como assaltou, com uma arma, um senhor na Cidade da Guatemala para financiar a produção de uma exposição.
Discutir, por meio da arte, temas como crise econômica e formas de crime é uma constante no trabalho de López. Nesse sentido, realizou, na Bienal do Mercosul, obras com caixas vazias contrabandeadas do Paraguai para o Brasil e, na Documenta de Kassel, na Alemanha, um dos mais célebres eventos de arte do mundo, entrevistou um sicário. Para manter o anonimato do matador de aluguel, colocou uma tela entre o assassino e o público, que realizou perguntas por cerca de 40 minutos.
Outras ações inesquecíveis foram jogar dez sacos de carvão em via pública antes de um desfile do exército, lembrando o genocídio e a carbonização de camponeses e indígenas por militares; despejar uma tonelada de livros em uma das vias mais movimentadas da capital do país; e, talvez a mais original, inaugurar uma exposição, ‘As pessoas bonitas’, em que os seguranças tinham a liberdade de deixar entrar apenas quem eles julgassem belas.
Em pouco tempo, havia mais gente do lado de fora do que dentro da galeria – e o próprio artista foi impedido de entrar. A ironia do título ganhava sentido, pois mostrava como o concito de beleza está marcado pela subjetividade e pelo relativismo. Por tudo isso, Aníbal López é um artista a ver, rever, pensar e repensar continuamente.
Oscar D’Ambrosio é jornalista pela USP, mestre em Artes Visuais pela Unesp, graduado em Letras (Português e Inglês) e doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.