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Artigo – Direitos e tecnologia unidos pelo bem comum

Caio Augusto Silva dos Santos*

Muito se discute sobre a necessidade de preservação do mercado de trabalho da Advocacia. Isso se dá não apenas em razão do significativo número de bacharéis em Direito, mas também em decorrência do razoável contingente de profissionais em atuação e da introdução dos mecanismos pertinentes à inteligência artificial em meio à prática do Direito.

De início é preciso sopesar que a preservação do mercado de trabalho da Advocacia, antes de se resumir a discussão com interesse exclusivamente corporativo – e nada haveria de errado se o fosse, haja vista a legitimidade da OAB em zelar pelo exercício de uma vida profissional digna aos seus integrantes –, perpassa pela necessária compreensão da missão constitucional atribuída aos advogados pelo artigo 133 da Constituição Federal. Ora, em razão da indiscutível assertiva de que o advogado é indispensável à administração da Justiça, não se pode perder de vista que o referido mandamento constitucional traz como raiz fundante da sua existência a proteção do Cidadão, daí porque não se pode extrair qualquer outro significado desse imperativo, senão aquele que nos conduz ao reconhecimento de que a Advocacia se constitui no bastião de defesa de todos que integram a sociedade.

Num segundo momento, importa considerar que, diante da missão constitucional atribuída à Advocacia, jamais se poderá abrir mão de sua indispensável qualificação técnica, o que somente será alcançado por meio da adoção de providências de valorização da qualidade intelectual de quem pretende servir diretamente o Cidadão. A preservação e o fortalecimento do Exame de Ordem, como instrumento de proteção da sociedade, e a manutenção de cursos de aperfeiçoamento profissional são essenciais. A primeira providência está garantida pela própria Constituição ao destacar a indispensabilidade do Advogado, ou seja, a obrigatoriedade de sua presença em todas as searas onde se pretenda discutir direitos do Cidadão. Já a busca da qualificação técnica é obrigação da qual esta Gestão se desincumbirá todos os dias, mediante realização de palestras e cursos em todo o Estado, assim como por meio de mecanismos sob a responsabilidade da Escola Superior de Advocacia (ESA). Nesse ponto é importante destacar que estamos assegurando aos recém-ingressos nos quadros da instituição, nos três primeiros anos de inscritos, o acesso gratuito a todos os cursos realizados pelo sistema de Ensino a Distância (EaD) ministrados diretamente pela ESA.

De sua vez, nenhum espaço público ou privado, por maior que seja a demanda de trabalho, poderá encarar o uso da inteligência artificial como substitutivo da inteligência humana, tampouco como instrumento para a transformação dos direitos do Cidadão em pratos prontos imutáveis, que poderão ser imediatamente servidos ou negados segundo a conveniência das vontades das assessorias das autoridades como se estivéssemos todos em um grande fast-food de direitos.

A tecnologia há de servir as pessoas e não o contrário. Há de se ter sempre a compreensão de que a sensibilidade e a genialidade peculiar às pessoas, notadamente nas atividades intelectuais como a Advocacia, são indispensáveis e insubstituíveis. Por isso, a proteção constitucional contra a automação (art. 7º, XXVII, CF) alcança, pela mesma razão da norma principiológica que a sustenta, tanto a Advocacia quanto o seu beneficiário direto – o Cidadão –, tudo para que a atividade advocatícia, indispensável à sustentação da defesa dos direitos e garantias fundamentais de todos, seja preservada em favor da coletividade. A salvaguarda dessas premissas evita os arroubos impiedosos do lucro fácil e desmedido de particulares que pretendem substituir Advogados por robôs, e também a lógica unicamente economicista do Estado, que dá atenção apenas às estatísticas produzidas com base no seu orçamento e no tempo das suas respostas, sem qualquer preocupação com a qualidade e sensibilidade do serviço prestado frente às múltiplas e imprevisíveis realidades fáticas vividas pelo Cidadão.

Do ponto de vista da legislação, o que protege o mercado de trabalho da Advocacia é a própria Constituição. Do ponto de vista ético e moral, a proteção é encontrada na compreensão e na vigilância de todos de que somente com a preservação da qualidade dos Advogados e da sensibilidade e da genialidade humanas é que todos sairão vitoriosos.

Em conclusão: cônscia de seu dever legal e institucional, a OAB SP não se furtará a adotar todas as medidas legítimas e democráticas ao seu alcance para preservar o mercado de trabalho da Advocacia, discutindo inclusive as importantíssimas questões pertinentes aos honorários e salários percebidos pelos Advogados quando do exercício das suas atividades, para a garantia de uma vida digna àqueles que receberam a missão constitucional de representar a maior autoridade de todas em um Estado Democrático de Direito, que é o Cidadão.

(*) Caio Augusto Silva dos Santos é presidente da OAB SP

Redação

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