Início Cultura e Lazer Caetano e Daniela Mercury atacam a censura em novo axé de Carnaval

Caetano e Daniela Mercury atacam a censura em novo axé de Carnaval

 

 

 

Uma reação carnavalesca à censura das artes reuniu em estúdio, pela primeira vez, o compositor Caetano Veloso e a cantora Daniela Mercury, em Salvador. “Tá proibido o Carnaval/ Nesse país tropical”, diz o refrão da música “Proibido o Carnaval”, composta pela rainha do axé.

O mote da proibição da folia surgiu há quatro anos, mas a letra ganhou corpo depois dos vetos e protestos ultraconservadores contra exposições e performances no país. “Abra a porta desse armário/ Que não tem censura pra me segurar/ Abra a porta desse armário/ Que alegria cura/ Venha me beijar”, cantam os artistas que marcaram a história do Carnaval da Bahia. A faixa de três minutos e 53 segundos será lançada hoje.

Este repórter acompanhou três horas de gravações do clipe de Caetano e Daniela no Fera Palace Hotel, no centro de Salvador, nesta semana.

A produção mobilizou 14 bailarinos e 12 modelos para integrar canto e dança, dentro do estilo dos desfiles da cantora nos trios elétricos. Em 1992, o clipe de “Você não Entende Nada”, composição do tropicalista, celebrou o primeiro encontro audiovisual da dupla.

“Daniela é uma figura que foi sempre reinventora do fenômeno que é o Carnaval de rua da Bahia. Ela segue em frente, criando coisas. Eu gosto muito de ‘Rainha Má’, mas essa nova é uma canção que tem uma vitalidade propriamente carnavalesca. Ela tem a alma da marchinha de Carnaval, com o poder satírico, mas, ao mesmo tempo, livre da própria sátira que faz. É carnaval, mesmo”, disse Caetano, em temporada de veraneio.

“Evidentemente, é uma reação, uma resposta à tendência censora dos poderes brasileiros hoje. Isso é interessante. Na história das marchas de Carnaval, o comentário político ou social sempre houve. Nesse caso é muito autenticamente feito do jeito carnavalesco de tratar essas coisas. Achei que é uma grande música de carnaval, que reafirma a posição histórica de Daniela”, completou.

Às 20h30, Daniela entrou em seu quarto e espalhou na cama as alternativas de figurino. “A ideia é fazer uma ho- menagem bem ousada aos Dzi Croquettes”, avisou a Caetano. Ela recordou então as aulas de dança com Lennie Dale, coreógrafo do grupo contracultural, e a colaboração de Cláudio Tovar com as suas fantasias carnavalescas.

“Vou pôr seu marido nu numa banheira com bolas cor-de- rosa”, brincou com Paula Lavigne. “Você quer que o Carnaval seja proibido mesmo, né?”, sorriu a produtora. Por fim, Caetano escolheu uma casaca com gola de paetês e enlaçou uma gravata rosa.

“Bolsonaro é a consequência dessa sensação nossa de que a gente tem que resolver as coisas de forma imediatista, que é alguém que vai salvar a gente e não a democracia”, comentou Daniela, enquanto estava fora de cena. “As coisas estão acontecendo. É uma tentativa de proibir o que não pode ser proibido, o que a gente lutou tanto para libertar.”

A cantora convocou a voz de Caetano por associar a canção anticensura à tropicália. “O axé é encarnação do desejo tropicalista de liberdade, democracia e brasilidade”, explicou. “Essa letra foi feita agora. Só a ideia de que está proibido o carnaval é antiga e gerou a ‘Rainha Má’ [em 2015]. Quem proibiu o Carnaval foi a Rainha Má, meu alter ego.”

De última hora, ela mencionou na letra a declaração da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, de que “menino veste azul e menina veste rosa”. Num dos versos, surge a pergunta: “Vai de rosa ou vai de azul?”.

Redação

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