Por Luís Carlos Bedran
Muito já se falou sobre o processo da separação do Brasil de Portugal, proclamada por D. Pedro I em 7 de setembro de 1822, às margens do Rio Ipiranga. Um historiador e jornalista, Laurentino Gomes, em seu livro “1822’ nos fornece detalhes pitorescos e curiosos sobre todo aquele período e sobre os antecedentes políticos que culminaram nessa data.
Tudo começou com Napoleão em guerra contra a Inglaterra, além de outros países. Ele decretou o Bloqueio Continental, a proibição de negociar com a Inglaterra, mas como a economia portuguesa se achava subordinada à deste país, a família imperial, com toda a Corte, não teve como resistir e se transferiu para o Brasil em 1808.
D. João VI assumindo o trono após o enlouquecimento de sua mãe D. Maria I, tomou uma série de medidas, tais como a abertura dos portos, a permissão para a instalação de manufaturas e, principalmente, a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido a Portugal e Algarves, o que provocou enorme insatisfação em Portugal.
Interessante foi que a emancipação política brasileira ocorreu sem convulsões sociais. D. João VI manteve a unidade política e territorial, mas, ao mesmo tempo, a Corte ficou constituída pela união entre os comerciantes portugueses e a nobreza burocrática, o que marginalizou os senhores rurais. Para ela ser mantida e sustentada, ele impôs uma série de impostos, além de emitir papel moeda pelo então Banco do Brasil.
Isso fez com que os senhores rurais brasileiros, escravistas, pensassem na emancipação do Brasil. Assim afloraram as tensões sociais, como a Revolução de 1817 em Pernambuco, liderada pelo padre e médico formado na França, Arruda Câmara, influenciado pelo Iluminismo do século 18 e um dos fundadores do Areópago de Itambé, sociedade secreta maçônica, um centro de propagação dos ideais anticolonialistas. A Revolução de 1817, que se estendeu por todo o Nordeste, foi duramente reprimida, com o fuzilamento dos revolucionários.
Por sua vez a Revolução Liberal do Porto, em 1820, obrigou D. João VI a enviar a Portugal seu filho D. Pedro, que não teve como resolver o impasse, pois os portugueses exigiram o retorno da Corte e recusavam a autonomia brasileira. Isso fez com que D. João VI retornasse a Portugal, deixando o Brasil para ser governado por seu filho, o príncipe regente.
Em nosso país criaram-se duas correntes: a dos colonialistas e a dos anticolonialistas, mas nenhuma delas colocava em questão a estrutura escravista da sociedade colonial. Uma terceira corrente foi formada: a dos liberais radicais, integrada pelas camadas urbanas, representadas pelos profissionais liberais, que se uniram às facções da aristocracia rural.
Mas o que precipitou a separação foi a emissão dos decretos da Corte ordenando o retorno de D. Pedro a Portugal, a exigência de obediência pelas províncias a Lisboa e não mais ao Rio de Janeiro e a extinção dos tribunais nesta província.
O Clube da Resistência no Rio de Janeiro fez uma representação, com a coleta de assinaturas onde se pedia que D. Pedro ficasse no Brasil. Foi o que ele fez, no chamado Dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822.
Um dos líderes desse movimento foi José Bonifácio de Andrade e Silva, nomeado por D. Pedro para o cargo de ministro do Reino e dos Estrangeiros. Apesar de o texto da convocação da Constituinte não falar em separação, Portugal exigiu o retorno do príncipe.
Isso fez com que ele, impelido pelas circunstâncias, proclamasse a separação do Brasil, chegando então ao fim do longo período iniciado em 1808 com a vinda da família real. Em outubro de 1822 foi aclamado imperador e em dezembro tornou-se o primeiro imperador do Brasil, com o título de D. Pedro I.
Essa é a história sintética da Independência. No entanto, não se pode afirmar que a emancipação política do Brasil trouxe alguma alteração em nossa secular estrutura social, pois a enorme população de escravos e de homens livres, não proprietários, espalhada pelo País e distante dos principais centros do litoral permaneceu absolutamente indiferente à separação.
O que simbolizaria o “7 de setembro”? Evidentemente é a afirmação de nossa nacionalidade, de nossa soberania política, no contexto dos países existentes no mundo e, historicamente, não pode ser menosprezada. No entanto, se supostamente podemos dizer que o nosso país é soberano politicamente, no panorama internacional, tal como naquela época, por ocasião da separação de Portugal, não podemos afirmar dizer que ele seja independente economicamente, pois acompanha ‘pari passu’ tudo o que ocorre no mundo nesse aspecto e no mesmo diapasão dos países nesse século 21.
É verdade que mesmo no século 19, pode-se contestar que ele tivesse sido independente em sua economia, mesmo porque não somente ficamos muito endividados com a Inglaterra, como nossa matéria-prima sempre foi típica de exportação e por isso mesmo dependíamos da economia mundial.
Mas atualmente é maior ainda pela globalização, onde qualquer abalo, até mesmo o financeiro que acontece em países de economia forte, como nos EUA e China, repercute intensamente no nosso, pois ainda continuamos a ser um país tipicamente exportador. Não somos, pois, independentes na economia.
Mas será que somos verdadeiramente soberanos politicamente? Aparentemente sim. No entanto, como fazemos parte da chamada civilização ocidental, os nossos valores são os mesmos daqueles países que dela fazem parte, os europeus e os da América, tanto a do Norte, como a do Sul. Há exceções, evidentemente, mas essa é a regra geral.
Estamos intimamente ligados a eles pela nossa formação democrática, inserida em nossa Constituição, que não é diferente nesse aspecto das constituições desses países. Por isso a nossa soberania política há de ser encarada nesse contexto e toda e qualquer violação dos direitos do homem, constantes da Declaração Universal dos Direitos Humanos que eventualmente podem ocorrer no mundo, nas mais várias nações, além dos tratados internacionais e convênios dos quais fazemos parte, obrigatoriamente temos o dever de manifestar nosso repúdio e solidariedade em conjunto com os países que compartilham os nossos princípios.
Assim, podemos afirmar que somos soberanos politicamente no que tange aos nossos problemas internos; mas não o somos internacionalmente, pois não estamos isolados do contexto mundial. Proclamamos a separação de um país do qual estávamos dependentes no século 19; porém hoje, no século 21, nossa independência, tanto a econômica, como a que se refere à política externa, da qual estamos vinculados, já não podemos mais dizer que somos completamente independentes.
E sobre a Amazônia, que tem sido o assunto mais polêmico atualmente e que tem mexido com os nossos brios patrióticos, ficará para outra ocasião.