Se for verdade que os fantasmas ainda assustam, e não apenas as crianças, o cenário político brasileiro conta atualmente com a volta de antigos espectros, que se consideravam praticamente varridos do mapa, além do surgimento de novos e, por certos aspectos, ainda mais perigosos.
Na verdade, as distinções entre as visões esquerdistas e direitistas há muito deixaram de existir, ou ao menos se tornaram menos nítidas, talvez até mesmo antes da queda do Muro de Berlim e do desmantelamento da União Soviética. Quanto ao populismo, a questão é ainda mais delicada, pois ele se apresenta mascarado, mas sempre à espreita, em uma sociedade conduzida pelo gossip das redes sociais e manipulada por grupos midiáticos.
A real extensão do perigo dos novos fantasmas e da ressurreição dos velhos ainda não foi devidamente mensurada. Mais do que populismo ou de esquerdismos e direitismos, trata-se do esgotamento do modo de fazer política, cada vez mais distante do cidadão real, pagador de impostos e vítima da manipulação midiática.
Depois da derrocada dos “-ismos” (comunismo, populismo, etc.) sobreveio o vazio. Quem normalmente se habilita a preenchê-lo? Aventureiros e demagogos, arautos que desejam restabelecer a ordem, geralmente após governos que supostamente se pautaram pela defesa dos direitos dos fracos e dos oprimidos (ou “descamisados”, para usar um termo muito empregado por um dos fantasmas atuais que deseja candidatar-se novamente).
O vazio de poder deixado ao léu por um governo ou por uma sucessão de governos incompetentes constitui o fato mais grave da situação política, brasileira e mundial, pois se por um lado é verdade que os “-ismos” de direita ou de esquerda não levavam e não levaram a soluções, por outro é certo que o vácuo que deixaram como herança tornou-se ainda mais pernicioso, adquirindo ares doentios, no qual bravatas de heroísmo, na defesa de antigos valores aparentemente perdidos, encontram espaço garantido e decolam nas pesquisas de intenção de voto nas próximas eleições.
Quem deveria preencher o vazio antes que um aventureiro lance mão? A responsabilidade é de todos: escola e mídia em primeiro lugar, mas também das famílias, da igreja e dos intelectuais e literatos. Vamos ensinar os que ainda têm ouvidos não “contaminados” pelos discursos de ódio e de suposto restabelecimento da ordem a duvidar, a não confiar em promessas fáceis, a exigir dados concretos e compromissos dos que se lançam em campanhas, a investigar e a analisar a trajetória política dos que se arvoram em defensores do povo oprimido.
Como exigir, porém, discernimento de quem frequentemente nada tem, nem condições mínimas de vida, nem acesso a livros e a escolas decentes? E assim, caímos num círculo vicioso que dificilmente conseguiremos romper. Não será certamente com a violência, já antes usada sem resultados, tampouco com a inércia de quem deixa o barco correr e espera que as coisas se ajustem. Boas intenções que se esgotam em paliativos ou em caridades momentâneas também não bastam, mas ultimamente até mesmo as boas intenções têm sido raras, o que dá a medida exata da gravidade da situação.
Enfim, para que se veja uma luz no fim do túnel é preciso evitar a desmoralização pública das poucas instituições sérias que ainda restam em pé. Cabe modernizá-las e aperfeiçoá-las, mas não submetê-las a críticas infundadas e baseadas em informações tendenciosas e sem critério, muitas vezes veiculadas pelos impérios midiáticos.