Verão

Luís Carlos Bedran*

Apagão

Raios, chuvas e trovoadas de assustar gente grande e pequena. Outro dia no bairro pifou a energia elétrica e por algum tempo, até voltá-la, os humanos se apavoraram. (Até mesmo os cães, hoje considerados gente…). Eles não conseguiram assistir novela, a internet desapareceu, lanternas saíram das gavetas, todo mundo ficou meio perdido. Acabou-se a civilização. Voltou-se à idade das trevas, tal qual na roça da lamparina, quando as pessoas se recolhiam para dormir. Como os passarinhos ao pôr do sol.

Mas tudo tem uma compensação. As crianças não conseguiram mais brincar com seus joguinhos eletrônicos individualistas, e então foram obrigados a brincar de pega-pega e a conversar com os pais. Tanto assunto houve que chegou num ponto em que, cansados, foram dormir contentes e felizes como os anjos.

Houve um produtivo diálogo familiar coisa que não acontecia fazia tempo. Aí então, coisa rara, o pai e a mãe até mesmo também conversaram. Ela deixou de assistir novela e ele deixou de lado o celular. Depois de um tempinho até mesmo brindaram à vida com um espumante não tão gelado e jantaram à luz de velas, num clima bem romântico. E até se amaram.

No que se chega à conclusão que felicidade não é exatamente sinônimo de civilização.

Leitura nas férias

Fazer o que nas férias com chuva quando não se consegue sair de casa? Tanta coisa! Depende apenas da imaginação. Mas existe uma forma passar o tempo que raras pessoas se dispõem a utilizá-la. É pela leitura de livros. Lê-los é muito comum nessa época, mas muito mais no hemisfério norte onde o frio é intenso e não se consegue sair à rua de tanta neve.

Não é à toa que é lá onde há uma profusão de escritores e se estes publicam seus livros nas tantas editoras, é porque há leitores. E muitos. Que adquirem os livros nas inúmeras e tradicionais livrarias de rua, onde podem folheá-los sem pressa, à vontade, como na França, Alemanha, Itália, Reino Unido. Talvez seja o intenso frio é que os incentiva a criarem, a pensarem, a imaginarem. A lerem.

O velho continente é o berço da cultura, o lugar onde a filosofia resplandeceu. Terra de Nietzsche, Sartre, Camus, Hegel, Marx, Leibniz. Como escrever sobre filosofia num país tropical? E a música então? Os grandes compositores clássicos. Lá o romance se desenvolveu, lá foi criada a literatura policial.

Quanto a esta, mormente na Inglaterra, há uma teoria, que, talvez num artigo qualquer já tenha exposto e que, certamente não é inédito. É que lá existe uma tradição democrática que vem desde a Idade Média, com o rei João Sem Terra, do julgamento das pessoas pelos seus pares, a origem do habeas corpus. Os direitos humanos sempre foram respeitados.

Então, para se desvendar a real autoria de um crime praticado por um suspeito, há de se aplicar a ciência, o raciocínio, as circunstâncias e, sobretudo, respeitar o cidadão, pleno de direitos. Agatha Christie, com o detetive Poirot, Conan Doyle com Sherlock Holmes. Na França, com o inspetor Maigret, de Simenon. E aí então, depois de muita análise, descobrir e punir o criminoso que até então era mero suspeito.

Mas aqui na América Latina? Nos trópicos? Raramente há escritores que se dedicam a criar romances policiais, porque fica muito mais fácil à polícia pôr no pau de arara o suspeito, obrigá-lo a confessar e aí então não há mais mistério. Culpado ou inocente, não importa. E haja imaginação para o escritor desvendar a autoria de um crime. Legalmente. Rachel de Queiroz disse certa vez ser impossível alguém conseguir ler algum livro na praia. Tanta gente seminua espalhada na areia, o mar, o calor. Impossível.

Apesar de tudo, com chuva ou sem chuva, com calor ou sem, ainda é gratificante a leitura de livros nas férias de verão.

*Sociólogo

Redação

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