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A transformação através da educação

José Augusto Chrispim

A educação como agente de transformação de vidas. Essa é a missão de parte do corpo docente da Escola Estadual Professor Victor Lacorte, responsável pela formação de presos que cumprem penas em três unidades penais de Araraquara. O grupo coordenado pela diretora da escola Silvana de Paula Corbi e pela coordenadora Fabiana Aparecida Mieli, conta com 13 professores de várias disciplinas que compõem a grade curricular do Ensino Fundamental I e II, e do Ensino Médio.

A professora Sabrina Graziela de Freitas, que está no projeto desde o início em 2013, quando a Secretaria da Educação assumiu o ensino no sistema prisional, vê grandes progressos entre os detentos que frequentam as aulas. “No início, não foi muito confortável, pois era uma coisa muito inovadora, não tinha muita informação de como seria. Antes de 2013, era um preso que auxiliava os alunos através da Funap, mas eles não recebiam certificado. Hoje, eles saem com o histórico igual ao de qualquer aluno, vinculado à escola Victor Lacorte”, disse Sabrina que dá aulas de português, artes e inglês.

Transformação
A professora Raphaela Tomya Marques Ferreira, que também leciona as mesmas disciplinas, lembra que no segundo semestre do ano todos os alunos fazem uma redação para um concurso da Defensoria Pública. “No ano passado, teve um aluno da penitenciária que recebeu um certificado de honra ao mérito, devido à nota dele nas olimpíadas de matemática. O ensino traz valores diferenciados. Você consegue ver uma pessoa de um jeito e, com o tempo, a educação e a leitura realmente vão transformando eles. Nós temos alunos que quando começaram não sabiam nem escrever o próprio nome. Eles começam a ter outra perspectiva também”, ressaltou Raphaela.

Desestruturação familiar
Para Sabrina, a baixa escolaridade é muitas vezes resultado de uma desestruturação familiar, o que acaba levando os jovens para o mundo do crime. “A maioria deles vem de uma família desestruturada e, por mais que frequentaram a escola, não sabem sequer escrever o próprio nome. Tem muita gente que você vê que acaba fazendo do crime um meio de vida, mas tem outros que foi por falta de opção mesmo. Eu tive um aluno no sistema penal recentemente que é ex-aluno do Victor Lacorte. Um menino sempre muito quieto e apático na escola. E agora, eu o reencontrei dentro da penitenciária sem saber ler e escrever. Ele me disse que quando a polícia o abordou e perguntou a sua data de nascimento, ele não soube dizer. A escola também é um bom recurso para ocupar o tempo e abate o tempo de pena. Tanto na penitenciária como no CR masculino, tem o Clube da Leitura, da Funap. A maioria deles tem uma habilidade fora do padrão em alguma atividade, desenho ou escrita. Dá dó, porque você vê a habilidade da pessoa e ela está lá à mercê da sociedade”.

Reclusão
Com 90 alunos no Centro de Ressocialização (CR) masculino e 170 na Penitenciária de Araraquara, as professoras cumprem uma carga horária de 7h30 de aulas diárias, divididas entre o período da manhã e da noite, as educadoras lecionam 200 dias por ano. Desde 2013, as amigas que já deram aulas no interior das unidades penais por cerca de 1.200 dias, brincam que já cumpriram mais pena que muitos lá dentro. Mas ressaltam que é com grande prazer que desenvolvem seu trabalho e que aprendem muito também com os alunos.

Projetos de ensino
As professoras destacam a participação de textos dos reeducandos no livro “Antologia de Textos. Informação e Conhecimento – O Papel da Escola na Era Digital”, feito pela Diretoria de Ensino – Regional Araraquara.

“No ano passado, nós conseguimos com o sistema prisional participar do livro da Diretoria de Ensino. Tem textos de alunos da Penitenciária, CR feminino e CR masculino. Seis alunos foram selecionados. O livro foi lançado em dezembro. Por estarem há um bom tempo reclusos, os alunos conseguiram escrever muito bem. Um artigo perfeito. Todo ano a diretoria faz. Mas desde de 2013, essa é a primeira vez que nós conseguimos ter algum material para participar”.

As educadoras também desenvolveram o ‘Projeto – Insuficiência ou Ausência’, que utilizam com os alunos das duas unidades prisionais. “Nós trabalhamos esse ano com esse projeto, porque eles têm muitas limitações intelectuais. E foi um sucesso entre eles”, falou Sabrina.

“Eles perceberam que muitas vezes foram tratados desde sempre como burros que iam à escola e não conseguiam acompanhar. Claro que nós não fizemos um diagnóstico, a gente quis mostrar que alguns podem ter alguma deficiência, como dislexia. Trabalhamos também a inserção dos deficientes lá dentro. Por exemplo, no ano passado nós tivemos um aluno no CR masculino que era surdo e nós tivemos que nos virar. Mas foi uma das pessoas que saíram de lá e já estão fazendo curso fora. Ele não sabia nem escrever o próprio nome, mas por fim, ele chegou até a falar”, destacou Sabrina.

Ressocialização
As educadoras acreditam que o trabalho de educação realizado no sistema penal consegue melhorar a vida dos envolvidos. “Hoje nós já notamos a mudança devido à procura pelo histórico escolar, no começo era bem pouco. Agora, na nossa visão, a partir do momento que você procura um histórico escolar é porque você quer ter uma vida melhor, está almejando algo a mais. Eles não estão parando por aí. Nós estamos conseguindo fazer esse trabalho, mudando essa perspectiva deles”, concluíram.

Redação

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