*Artigo
O último processo eleitoral e o resultado das urnas são contundentes ao mostrar que falhamos na educação para participação política, na compreensão da gestão pública e, principalmente, no respeito às ideias distintas das nossas.
Sim, estávamos acostumados a falar que o Brasil era um país que aceitava povos com origens distintas, raças misturadas, que homens começaram a reconhecer os direitos e respeitavam as mulheres, que as crianças e adolescentes começaram a ter uma educação de qualidade. Enfim, achávamos que estaríamos num patamar de civilidade que os direitos e o respeito ao diferente estavam na agenda.
Mero engano.
Avançamos em muitas áreas no Brasil, criamos canais de participação importantíssimos para ampliar o poder de decisão do brasileiro para além do voto. Mas falhamos em alguns pontos cruciais.
O período da redemocratização no Brasil trouxe inúmeras inovações na gestão pública brasileira, entre elas novos canais de participação da sociedade no acompanhamento das políticas públicas e nas decisões do poder executivo. Criamos os conselhos municipais, leis de iniciativas populares, plebiscitos, orçamento participativo, a participação do terceiro setor através das ONGS entre outros instrumentos de gestão e de decisão.
Mas, onde falhamos?
Falhamos na educação. Falhamos quando criamos instrumentos novos de participação e não educamos a sociedade para a utilização desses instrumentos. Falhamos quando pensamos a educação brasileira e não reservamos um espaço na grade com conteúdos básicos para compreensão das regras do jogo da democracia.
Criamos canais de participação e tomada de decisão sem conversar com quem esperávamos que participasse e tomasse decisão. Pergunto a você leitor. Você já foi chamado, em algum momento, para tomar uma decisão em conjunto? Na escola? No trabalho? Na sua casa? No clube? No seu bairro? Na sua cidade?
A resposta, na maioria dos casos, é negativa por dois problemas. O primeiro é que não temos o hábito de decidir coletivamente. Achamos que nosso poder de decisão se restringe às urnas.
O segundo problema é sobre a forma da participação. Quais são as regras do jogo da participação? Como posso participar? O que posso ou não fazer? O que é e para que serve um conselho municipal? Como posso fazer parte do conselho? Essas respostas não são conhecidas pela maior parte da sociedade. O mais grave, muitas vezes, o próprio conselheiro não sabe a função do conselho e as suas atribuições.
Nas últimas décadas ampliamos o número de crianças e adolescentes nas escolas no Brasil, ampliamos o número de vagas nas universidades. Levamos, através do ensino a distância, ensino superior às pessoas que não tinham tempo e universidades em suas cidades. Resumindo, ampliamos a rede de ensino.
Mas ainda continuamos falhando.
Falhamos em pensar que apenas inserir as pessoas numa instituição de ensino resolveria o problema. Falhamos quando não construímos, em parceria com a sociedade, conteúdos que tivesse como objetivo auxiliar o jovem sobre a sobrevivência fora de casa e fora da escola. O que o aluno ao final do ensino médio aprendeu a fazer? Ele conhece como foram conquistados seus direitos? Ele conhece quais são esses direitos? Ele conhece formas de participação para lutar por avanços? Ele aprendeu a respeitar o que é diferente dele? Ele aprendeu a se comportar numa entrevista de emprego? Numa empresa? Aprendeu a perder? Aprendeu a ouvir um não? Ele construiu bases mínimas para sobreviver fora da sua bolha?
Pois bem, falhamos!
Os resultados das urnas, por mais que nossa elite “intelectual” reclame, é consequência. Consequência de nossas falhas, sobretudo com a educação. Como esperar que o respeito nos guiasse nesse processo eleitoral se não consolidamos tais ideias como conhecimento no país. O respeito ao diferente, à democracia não pode se expressar nas urnas porque ele não é constitutivo de nossa cultura e só o será quando democratizarmos o conhecimento sobre esta questão tão complexa chamada POLÍTICA.
(*) José Antônio da Silva Junior é Cientista Político e consultor da IDEAL – ESCOLA DAS CIDADES. É Bacharel em Sociologia e Política, Mestre e Doutor em Ciências Sociais, pela UNESP.
(*) Edna Sandra Martins é socióloga e consultora da IDEAL – ESCOLA DAS CIDADES. É Bacharel em Ciências Sociais e Doutora em linguística, pela UNESP e Especialista em Gestão Pública pela UFSJ.