Por Luís Carlos Bedran
O ser humano, em sua grande maioria e durante toda sua existência, geralmente limita-se apenas a lutar duramente para conseguir manter-se e reproduzir-se, porque não encontra alternativa na sociedade que o permitiria a procurar viver bem e melhor, isto é, de acordo com um pensamento mais abrangente, fora daquela pequenez.
E quem consegue ter condições para viver melhor, não deixa de ser, como de costume, uma minoria privilegiada. Não é à toa que desde os primórdios da civilização sempre foi uma constante a luta entre as pessoas, classes, clãs, tribos, etnias, nações, no que se poderia afirmar que, se isso faz parte integrante da condição humana — como disse a filósofa Hannah Arendt (1906-1975) em obra do mesmo nome —, não deixa de ser mais ou menos semelhante, guardando-se as devidas proporções, ao que ocorre no mundo animal.
Mas justamente por sermos animais racionais é que deveríamos ter consciência de que isso não é o certo e que deveria haver na sociedade civilizada um maior equilíbrio em todos os aspectos, político, social e econômico, porém de tal forma, que todos pudéssemos viver com dignidade e justiça.
Em que, “ipso facto”, não mais deveria haver pessoas tão pobres, menos ainda as muito ricas, em que todas poderiam aproveitar, durante todo tempo de suas vidas, as benesses proporcionadas por um Estado de bem-estar social neste século em que a ciência alcançou os níveis mais altos de conhecimento.
Poder-se-ia dizer que, por isso mesmo, por sermos seres racionais, isso nunca aconteceu na História e, possivelmente, jamais acontecerá. No entanto, mesmo concordando com essa hipótese, nem por isso poderíamos deixar de lutar para que haja aquele equilíbrio, porque, caso contrário, então seria a negação da esperança, seria a inevitabilidade de um processo civilizatório que vai contra a racionalidade ínsita no homem.
Pois somos condenados a pensar; difícil, senão impossível, sermos diferentes. Mas é por isso mesmo que deveremos reagir sempre contra as injustiças e contra as iniquidades, muito embora nem todas as pessoas — talvez a maioria — pouco se importam com o que se sucede ao seu redor, querem mesmo é viver egoisticamente.
Se fosse possível, o que não seria tão difícil assim, pudéssemos ter uma educação ou formação que nos obrigasse, ou melhor, que nos conscientizasse a se dedicar também aos nossos semelhantes, ao Outro, certamente viveríamos muito melhor em nossa sociedade.
Essa reação contra o injusto, originária desde a infância, pois todos temos essa noção desde tenra idade, deveria ter início já no ambiente familiar, com o pressuposto de que fosse bem estruturado. Daí então partiríamos para a sociedade onde vivemos e tentaríamos modificá-la para atingirmos aquele desiderato: um mundo igualitário.
Esse pensamento ou ideal pode ser considerado utópico, não é novidade, pois sempre existiu desde épocas priscas e continua a existir. Ainda bem. Por isso é que, dentre tantas teorias políticas, a mais moderna, a que mais se coaduna com o ser humano racional neste século 21, científico, a que vige nos países europeus mais avançados econômica, social e politicamente, é a social democracia.
Porque aquelas pessoas, cujos países sofreram duramente nas duas grandes guerras, perceberam que deveriam lutar pela igualdade, contra as injustiças, tudo para o crescimento do ser humano, compatível com a nossa dignidade. E essa é uma luta que tem de ser constante e sistemática porque, como é próprio entre nós, seres humanos, há os mais vários interesses que tentam constantemente minar aqueles ideais.
É luta que pressupõe ação e não omissão, porém sempre dentro de um Estado democrático de Direito, sem violência, com ampla liberdade de imprensa, em que nossas instituições republicanas, Executivo, Legislativo e Judiciário possam agir dentro dos princípios e das cláusulas pétreas da nossa Constituição. Em que o Estado, nesse caso, em nosso país, possa, em nosso sistema capitalista, talvez neocapitalista, compatibilizar dois fundamentais interesses: o do bem-estar do povo e também o da iniciativa particular. Esse seria um Estado ideal, o do chamado “Wellfare State”, o melhor para todos nós, “data venia”.
Se essa pretensão é difícil, não é impossível. Por isso não se deve dar oportunidade para aqueles que somente veem seus próprios interesses pessoais e político-econômicos, em detrimento do bem-estar do povo, mas demagogicamente em nome deste. Essas são pessoas perigosas, se não os fascistas ou os integralistas saudosos da prepotência e da arbitrariedade, cuja ideologia pensávamos já estar extintas em nosso país, também os que se arvoram, a pretexto da igualdade e contra as injustiças sociais, a volta de uma outra ideologia, essa esquerdizante, porém completamente ultrapassada desde o século 19.