Psicólogo Flávio Melo Ribeiro
Desapego é um sentimento que mexe com a personalidade humana, pois
traz elementos de posse aprendidos desde a infância que ajudaram a
constituir o seu EU. A primeira relação interpessoal da criança é a dialética
do EU e do TU, também considerada uma relação de corredor, porque
embora possa se relacionar com várias pessoas, ela só o faz uma por vez.
Com o passar do tempo, a criança começa a entender que essas relações
podem ocorrer no mesmo momento, então ela passa a viver a estrutura do
NÓS. No entanto, o ponto de união é ela, ou seja, o ponto de vista sobre o
mundo é sempre o dela, por isso que se diz que o ego está centrado nela.
Tendo isso em mente, pode-se dizer que a posse sempre vai ser dela.
Entretanto, no momento em que se dá conta que as demais pessoas com
que se relaciona também podem se relacionar entre si sem sua presença,
ela constitui a vivência do ELES e se percebe fora da relação. Essa cisão a
faz sentir uma perda e consequentemente surge o sentimento de ciúme. É
nessa época que a criança quer se meter entre o pai e a mãe, faz birra
quando se vê de lado e passa a exigir que o mundo continue a existir para
ela. Surge o egocentrismo. Por isso que o desapego é tão difícil para
algumas pessoas, pois de alguma forma elas não conseguiram ultrapassar
as perdas e apresentam dificuldade para superar as frustrações. Elas
mantêm o sentimento de posse absoluta e isso dificulta a vida dinâmica que
o mundo apresenta aos adultos.
Antes de aprofundar o tema é preciso deixar claro que desapego não
significa deixar de lutar pela coisas importantes da vida. Lute com unhas e
dentes se for necessário pelos projetos que lhe são fundamentais. Mas por
que o desapego é importante? Porque para iniciar um novo ciclo de vida é
fundamental deixar para trás o que não lhe serve mais. Pare e perceba o
quanto você ainda arrasta consigo: coisas, lembranças, sentimentos e
pessoas. Renovar é preciso! Há milhares de anos você encontra essa
máxima, mas por que é tão difícil desapegar?
Primeiro é preciso aprender a lidar com a frustração. Frustração é perda, é
perceber que o outro existe no mesmo mundo que o seu, que não existe um
mundo teu. Entender que no mundo todos existem e buscam seus
respectivos projetos e que nesse ambiente dinâmico às vezes se ganha,
mas também se perde. Superar as frustrações é identificar os limites e
saber ultrapassá-los com ética e estratégias adequadas. Psicologicamente,
desapegar é crescer. É preciso deixar para trás a infância, esse período em
que o egocentrismo fazia parte da formação da personalidade. O mundo
adulto é de responsabilidades para cumprir os compromissos; de ética
para fazer o que é certo; de empatia para se colocar no ponto de vista do
outro; de segurança psicológica para construir seus projetos; de
serenidade para saber que, apesar de perder uma batalha não significa
que a guerra está perdida; e, principalmente, de conhecimento para saber
que não se faz um bom omelete sem quebrar os ovos. Desapegue para
evoluir.
Psicólogo Flávio Melo Ribeiro
CRP12/00449