sexta-feira, 20, setembro, 2024

Antigos amigos pescadores

Mais lido

Luís Carlos Bedran*

 Nesta época de tanta confusão na política, coisa jamais vista antes no País e apenas a quatro meses das eleições, não adianta ficar a imaginar quem serão os tantos pré-candidatos ou candidatas que disputarão a Presidência da República, ou os dois que conseguirão chegar ao fim no segundo turno (caso ocorra).

Além do mais, em respeito à opinião dos esclarecidos leitores e das inteligentes leitoras, não confessarei quem é o meu pré-candidato. Mas afirmo que não deixarei de ir votar, não votarei em branco, nem anularei meu voto, coisa jamais feita antes em minha vida de votante.

É que vocês, pelo menos os mais jovens, sequer podem imaginar o quão gratificante é os cidadãos, depois de mais de duas décadas, terem conseguido recuperar o direito de voto, pela redemocratização, antes proibido pela intervenção militar. Apenas darei uma dica, que até já devem supor pelo vernáculo: é do sexo masculino, não é nem da chamada ‘esquerda’, menos ainda da intitulada ‘direita’, posições essas indefiníveis neste século.

Então, no aguardo dos acontecimentos, nada como partir para amenidades, como falar sobre pescarias. E a recordar dos velhos amigos pescadores que já partiram, há muito tempo, para o Oriente Eterno em Araraquara.

            Como o Mário Barbugli. Um homem metódico que passava todo o fim de semana com os amigos em seu pesqueiro nas margens do Moji Guaçu. Sabia quando estava bom para se pescar dourado, ao encher um copo da água do rio. Como? Pelo grau de transparência, se ela estivesse mais ou menos turva.

Então colocava seu motor Johnson na água e ia pescar de rodada. Caso contrário, apoitava no barranco, em lugar cevado, para pescar piavas; isso quando não ficava em sua estiva coberta.

            Como o Dr. Domingos Abritta, seu companheiro de pescaria e que preferia ficar na estiva fumando um enorme charuto, enquanto esperava o puxão das piracanjubas, pois elas ainda lá existiam. Sentado numa cadeirinha, mais filosofava do que pescava.

            Como o italiano Ferruccio Miari, dono do antigo Bar da Estação, quando ainda a ferrovia era direcionada aos passageiros, hoje inexistente, possuidor de uma paciência de Jó, nem tanto para pescar, mas para sintonizar no dial de seu rádio as ondas curtas, procurando notícias do exterior, principalmente as italianas.

            Como o Jorge Bedran que, quando não ficava na estiva, obstinado e paciente até o fim da tarde, tentando pegar os ximburés e as piavas, subia em seu barco e ia pescar num córrego, o Guariroba, afluente do Moji, onde se divertia fisgando pequenas piavas e lambaris, às vezes até sozinho. Numa dessas vezes sua canoa bateu numa pequena árvore que tinha um cacho de abelhas. Elas se agitaram e ele foi obrigado a cair na água, pendurado na canoa (não sabia nadar) durante uma eternidade, até o enxame se dispersar. Disse-me ele que foi difícil de se safar e depois subir na canoa, pois era um tanto gordo e pesado.

            Esses quatro amigos, verdadeiros irmãos, depois do jantar se reuniam para jogar buraco que varava a madrugada e a bater papo, recordando antigas pescarias, quando havia fartura de peixes. Nem existia televisão para impedir o diálogo como ocorre atualmente nos ranchos modernos: hoje parece que os pescadores são movidos a álcool para se distrair. Talvez porque não haja mais tanto peixe como no passado.

            Outro antigo companheiro de pescaria era o Engº Marco Antonio Dentillo, que faleceu tragicamente num acidente na estrada quando ia pescar no Rio Taquari, no Estado do Mato Grosso do Sul. Embora convidado, não pude ir com ele. Também pescávamos no Anhumas, Jacaré e Moji. Perseverante e paciente, ficava o dia inteiro na beira do rio e depois voltava completamente revigorado para a cidade.

            E assim, a deixar de lado provisoriamente as preocupações sobre o futuro do País enquanto as eleições não chegam, lembro-me dos antigos amigos pescadores, pessoas politizadas, que nunca poderiam imaginar que pudéssemos chegar a tal estado de coisas, a um nível tão baixo de nossos representantes.

*Sociólogo

Redação

Mais Artigos

Últimas Notícias