CEI do Assédio pede providências urgentes para regularizar uso de arma de fogo por GCMs

Comandante relatou que não há relação dos guardas que utilizam armas próprias, no entanto, há uma tentativa de se criar uma

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A Comissão Parlamentar Especial de Inquérito que investiga denúncias de assédio moral no âmbito do serviço municipal, divulgou um relatório parcial sobre o andamento dos trabalhos.

O ponto que mais chamou a atenção é a necessidade de regulamentação do uso de armas de fogo particulares por guardas municipais de Araraquara.

Veja abaixo o relatório parcial na íntegra:

RELATÓRIO PARCIAL DA COMISSÃO ESPECIAL DE INQUÉRITO PARA

PROVIDÊNCIAS

Data: 07.11.2025

I – Exposição da Matéria em Exame

A presente Comissão Especial de Inquérito foi regularmente instaurada a partir do Requerimento no 1557/2025, de autoria dos vereadores Alcindo Sabino, Aluísio Boi, Guilherme Bianco, Marcão da Saúde, Maria Paula. Fabi Virgílio, Filipa Brunelli, Paulo Landim, Marcelinho, João Clemente, Michel Kary, Coronel Prado, Balda, Dr. Lelo, Cristiano da Silva, Enfermeiro Delmiran, Giani Trevisóli e Rafael de Angeli, destinada a

apurar práticas de assédio moral no âmbito do serviço público municipal.

Conforme tudo que se colheu e analisou até o presente momento, apurou-se que: Há necessidade providências imediatas por parte do executivo municipal, no sentido de regulamentar/adequar a Lei Municipal no 8474/2018 que regula o porte de arma de fogo pelos Guardas Civis Municipais de Araraquara, juntamente com as Leis Federais no

10.826/2003 que trata di Estatuto do Desarmamento, A Lei Federal no 13.022/2017 que trata do Estatuto Geral das Guardas Municipais e a decisão proferida no Habeas Corpus Criminal no2368200-15.2024.8.26.000 (TJSP).

Em 23 de abril de 2025 foi encaminhado para Secretaria Municipal de Assuntos de Segurança e Mobilidade Urbana, pela Corregedoria da Guarda Municipal, ofício comunicando irregularidades envolvendo alguns guardas, vez que estariam portando de maneira ostensiva, arma de fogo particular durante o serviço, e que estaria contrariando o regramento municipal vigente.

A Corregedoria ainda fundamentou em seu ofício que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ratificou decisão em acórdão datado de 09/09/2024 no processo 1007648- 97.2023.8.26.0037 dizendo que “A Guarda Civil Municipal de Araraquara não é instituição armada” e que a Lei no 8474/2015 veda expressamente em seu artigo 2o a utilização e armas

particulares durante o regular turno de serviço e convocações extraordinárias.

Ressaltando ainda que inexistia controle dos armamentos particulares e que isto evidencia uma fragilidade administrativa. Por esta razão providências imediatas junto ao governo municipal, no sentido de regulamentar, fiscalizar deveriam ocorrer por não encontrar respaldo nem controle institucional efetivo.

Em relação a falta de controle, consta no sistema da Câmara, como correspondência recebida do Comandante Geral Sírio S. Magalhães Jr., no 638/2025, protocolo “10649/2025”, que não há relação dos guardas que utilizam armas próprias, no entanto, há uma tentativa de se criar

uma relação. Que nunca houve um controle dos guardas armados em serviço. E que não há uma relação das armas credenciadas na Guarda Municipal, tendo em vista, em razão do salvo-conduto, serem utilizadas armas particulares.

Em 07 de julho de 2025 a Procuradoria-Geral do Município, elaborou parecer assinado pelo Subprocurador Geral de Assuntos Estratégicos Osvaldo Balan Júnior, no Processo Administrativo 051.401/2025 como objetivo de analisar a possibilidade de adequação da Lei Municipal no 8474/2015 à luz da decisão proferida no Habeas Corpus Criminal no 2368200-15.2024.8.26.0000 pelo TJSP, bem como a Lei Federal no 10.826/2003 que trata do estatuto do Desarmamento e a Lei Federal no 13.022/2014 que trata do estatuto Geral das Guardas Municipais.

O parecer analisou a possibilidade de harmonização do conflito normativo identificado entre a vedação expressa ao uso de armas particulares durante o serviço e a concessão de salvo-conduto judicial permitindo o porte de arma, fator que gera insegurança jurídica e administrativa.

II – Conclusões do Relator

Analisados detidamente os documentos e as informações prestadas, com base nos elementos

fáticos e jurídicos, passo a expor minha conclusão:

A Lei Municipal no 8474 foi elaborada em 2015, antes da decisão do STF na ADI no 5948/2021 e da consolidação do entendimento de que as Guardas Municipais integram o Sistema Único de Segurança Pública. Como o contexto normativo e operacional não reflete a realidade atual, impor restrições ao porte de arma particular durante o serviço, encontra-se

em patente conflito com a hierarquia normativa federal e com a mais recente e vinculante jurisprudência constitucional, devendo ser imediatamente readequada.

Com efeito vinculante (erga omnes), tal decisão obriga a Administração Pública de Araraquara a respeitá-la e a harmonizar suas normas, pois a legislação federal posterior (Lei no 13.022/2014) não distingue o porte institucional do particular, exigindo apenas o atendimento aos requisitos legais.

Assim, a Administração Pública Municipal está constitucionalmente obrigada a acatar a hierarquia normativa e a jurisprudência vinculante do Poder Judiciário. O Colendo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já havia se manifestado nos Incidentes de Inconstitucionalidade no 126.032-0/5-00 e 138.395-0/3-00. Este entendimento, pacificado, foi consolidado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), que, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5948, julgada em 01.06.2021, declarou a inconstitucionalidade do Art. 6o, inciso IV da Lei Federal no 10.826/2003

(Estatuto do Desarmamento).

A decisão do STF na ADI 5948/2021 (posterior à lei municipal de 2015) removeu o obstáculo do critério populacional, alterando permanentemente o panorama jurídico do armamento das Guardas Municipais. A Lei Federal no 13.022/2014 (Estatuto Geral) e a decisão do STF exigem uma postura de fortalecimento e integração das Guardas na Segurança Pública, contrastando com a lei municipal.

Desta forma, pode-se dizer que a Lei Municipal no 8474/2015 está violando os seguintes princípios basilares da Constituição Federal de 1988:

Há necessidade de inicialmente esclarecer que a Constituição Federal de 1988 e as Leis Federais dela decorrentes (como a Lei no 13.022/2014 e a Lei no 10.826/2003) se encontram em um patamar hierárquico superior à Lei Municipal. Segundo a Pirâmide de Kelsen, o ordenamento jurídico impõe que a norma inferior (Lei Municipal) se curve e se conforme à

norma superior (Constituição Federal e Lei Federal). A Lei Municipal de 2015, ao contrariar o entendimento constitucional consolidado pelo STF em 2021 e esvaziar a eficácia da Lei Federal de 2014, torna-se materialmente inconstitucional e deve ser reformada para que o

Município atue em conformidade com o Princípio da Supremacia da Constituição.

1. Princípio da Isonomia (Art. 5o, caput, CF/88):

A restrição municipal cria uma discriminação irrazoável e desarrazoada entre os Guardas Civis de Araraquara e os de outros municípios, em franca oposição à igualdade perante a lei.

O Estado (o Município) tem o dever de tutelar o direito fundamental à vida e à integridade física de seus servidores, que exercem atividade de risco (segurança pública). Ao proibir o uso de meios lícitos de autodefesa (arma particular, nos termos permitidos pela jurisprudência do STF), o Município adota uma postura legislativa insuficiente na proteção de um direito fundamental, violando a Isonomia em sua vertente material.

2. Princípio da Eficiência (Art. 37, caput, CF/88):

A Administração Pública deve perseguir a máxima eficiência em seus serviços. A Guarda Municipal, ao ter sua capacidade de armamento drasticamente reduzida pela vedação municipal, compromete sua operacionalidade e sua capacidade de resposta pronta, especialmente em cenários de escassez de armamento institucional ou na defesa pessoal do

agente durante o deslocamento. A restrição legal impõe um obstáculo desproporcional e injustificado ao exercício da função, enfraquecendo a instituição e contrariando a finalidade do Art. 37 da Constituição, que visa o desempenho célere e produtivo da atividade pública.

3. Princípio da Segurança Pública e do Federalismo (Art. 144, § 8o e Art. 1o, CF/88): A Constituição Federal (Art. 144, § 8o) reconhece as Guardas Municipais como órgãos essenciais à Segurança Pública. A Lei Federal no 13.022/2014 (Estatuto Geral) buscou fortalecer essa atribuição. A restrição municipal, ao limitar o porte de armas, afeta a capacidade de atuação preventiva e defensiva do GCM, esvaziando o papel conferido pela

União. Isso representa uma violação da hierarquia normativa, pois a lei municipal está extrapolando sua competência legislativa e contrariando a Supremacia da Lei Federal e as decisões vinculantes do Poder Judiciário (STF/TJSP) que pacificaram a matéria. O Município deve atuar em harmonia com o Princípio Federativo (Cláusula Pétrea), acatando

a norma que confere eficácia plena ao porte para os agentes de segurança.

III – Decisão da Comissão Diante do exposto, recomendo a adequação legislativa imediatamente para a harmonização do conflito normativo tendo em vista insegurança jurídica e administrativa vivida até o presente momento.

Além disso, é necessário que a Prefeitura de Araraquara promova acordos de cooperação técnica com a Polícia Federal, de modo a garantir que todas as etapas fundamentais — como controle, registro, capacitação e fiscalização — sejam devidamente cumpridas, assegurando conformidade com a legislação federal e com as exigências institucionais que regem o porte de armas pelas Guardas Civis Municipais.

Recomenda-se também que o Município invista em capacitação técnica e psicológica contínua dos Guardas Civis Municipais, abrangendo treinamento de tiro, técnicas de abordagem, mediação de conflitos, primeiros socorros e direitos humanos, de modo a assegurar o uso responsável e proporcional dos meios disponíveis e o fortalecimento da

atuação preventiva e cidadã da corporação.

Da mesma forma, recomenda-se a implantação de câmeras corporais (body cams) nos uniformes dos agentes da Guarda Civil Municipal, como medida de transparência, proteção mútua e aprimoramento do controle das ações operacionais, contribuindo para a segurança dos servidores e da população.

Por fim, reconhecemos a supremacia da decisão judicial sobre a legislação municipal vigente, bem como o fato de que os guardas municipais contemplados pelo salvo-conduto possuem respaldo judicial para utilizar suas armas particulares. Todavia, visando preservar a segurança jurídica e a coerência normativa da Administração, recomendamos, até que se conclua a harmonização das normas aplicáveis, a suspensão do uso de armas particulares no âmbito institucional.

O presente relatório possui concordância de todos os membros da

Comissão Especial de Inquérito.

Cristiano da Silva

Relator da Comissão Especial de Inquérito

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