A votação das contas da Prefeitura dos exercícios de 2017 e 2018, os dois primeiros anos do 3º mandato do prefeito Edinho Silva (PT), estão gerando uma grande repercussão, pois vereadores da oposição e líderes políticos de direita da cidade estariam fazendo uma grande pressão sobre os vereadores da base do governo para eles votarem pela rejeição das contas que tiveram apontamento desfavorável pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).
A matéria deve passar por votação na sessão da Câmara Municipal, no próximo dia 28 de junho.
O assunto está gerando vários debates nas redes sociais entre os apoiadores de Edinho Silva e pessoas que são favoráveis à rejeição das contas e um possível afastamento do prefeito. Movimentos de apoio ao prefeito e contrários estão sendo divulgados pelas redes sociais para serem realizados no próximo final de semana.
O que diz a Lei:
O art. 1º, I, g, da LC no 64/1990 (Lei das Inelegibilidades), define que são inelegíveis para qualquer cargo “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos oito anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”.
Porém, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, em 30 de setembro de 2021, a Lei Complementar 184/21 que garante o direito de candidatura do gestor público que tenha tido suas contas julgadas irregulares, mas sem danos ao erário, e punido apenas com multa pelos tribunais de contas.
A lei tem origem no Projeto de Lei Complementar 9/21, do deputado Lúcio Mosquini (MDB-RO), aprovado nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado. Na época, Mosquini alegou que a medida, que cria uma exceção à regra geral de inelegibilidade de políticos, visa pacificar o entendimento da Justiça Eleitoral sobre gestores punidos com multa por erros formais, sem prejuízo para os cofres públicos, na prestação de contas. Segundo ele, há decisões contraditórias, ora impondo a inelegibilidade, ora autorizando a candidatura do gestor.
“Parecer desfavorável do TCE não é normal”
A vereadora Luna Meyer (PDT), que integra o grupo de vereadores que são favoráveis à rejeição das contas da Prefeitura, se posicionou em suas redes sociais sobre o assunto e disse que está sendo procurada por pessoas ligadas à base do governo pedindo para que ela repense seu voto.
Luna também fez uma relação de cidades do interior do estado de São Paulo com porte parecido com o de Araraquara que tiveram suas contas aprovadas pelo TCE, como é o caso de Bauru, São Carlos e Ribeirão Preto, entre outras.
A reportagem conversou com a vereadora que expôs suas justificativas para votar contra a aprovação das contas.
“Estive estudando profundamente os 3 pareceres do Tribunal de Contas do Estado dos anos de 2017, 2018 (que será votado) e 2019, todos desfavoráveis. Consultei também profissionais técnicos da área apartidários e o entendimento é só um: Não houve uma boa gestão do dinheiro público.
O principal ponto pra mim, é a questão dos precatórios (ações judiciais ganhas por servidores), que se iniciou em 2017 e nunca mais teve fim. Existem precatórios não pagos de 2017 que eram de 1000 reais e agora estão por volta 50.000 reais. Não tomar providências acerca disso é o que, senão, irresponsabilidade com o dinheiro público?
É notório que a prefeitura nunca se interessou em criar mecanismos para resolver a relação com os servidores, desde o início da gestão, e agora em 2022, somos a cidade que mais deve precatórios no estado de São Paulo num valor absurdo de 187 milhões. Que diga-se de passagem dobrou de 2021 e 2022 significando que nada mudou nesse sentido, mesmo sendo apontado em todos pareceres, apenas piorou.
E aí somos forçados a votar via Câmara um reajuste salarial infame com a desculpa desses precatórios com a ameaça de que se não aprovarmos não haverá reajuste algum.
Não acho que o Edinho seja corrupto ou que seu governo não tenha méritos, com certeza tem, a gestão com a Saúde é maravilhosa! Mas isso não anula o que precisa ser corrigido e investigado e estamos falando de administração aqui e houve sim, ainda há, irresponsabilidade na gestão com os servidores e seus processos que remontam desde 2017. Isso precisa ser investigado, julgado e, acima de tudo, resolvido.
Jogar milhões do nosso orçamento em precatórios não é um problema só dos servidores municipais, mas de Araraquara inteira e reflete em todos outros aspectos afetando diretamente a vida de todo cidadão”, relatou a vereadora à reportagem.
“Justificativas da Prefeitura são válidas”
Procurado pela reportagem de O Imparcial, o presidente da Câmara Municipal de Araraquara, o vereador Aluisio Boi (MDB), justificou seu voto a favor da aprovação das contas e ressaltou que há um grupo político na cidade que quer usar o assunto apenas de forma política e sem pensar na população de Araraquara.
“É muito complicado a gente decidir o futuro do prefeito que foi eleito 4 vezes pela população, por voto direto, mesmo porque o Tribunal é um órgão consultivo, técnico, mas, para governar é prática também, não é só a técnica que conta. Um exemplo disso é quem sabia que o prefeito teria que fazer uma intervenção na Santa Casa? Na última terça-feira, nós fizemos o remanejamento de R$ 5 milhões que podem daqui a 4 anos falarem que não deveria ter sido feito. Porém, muitas ações do Executivo são para o momento, que pode ser uma pandemia, uma catástrofe. Então quem está nesses órgãos técnicos não vive essa realidade. E há um histórico aqui da prefeitura e de outras prefeituras que tiveram as contas rejeitadas pelo Tribunal, desde o De Santi, pois não é a primeira vez que isso acontece, mesmo porque, as ações que foram feitas em 2018, ao meu ver, teriam que ser julgadas pelos vereadores daquela época que saberiam os motivos daquelas ações e porque foram feitos os apontamentos. Como não tem dolo, não tem corrupção, não tem improbidade e, com certeza, as mudanças foram feitas para atender a saúde e a vida das pessoas, por isso, de forma alguma, eu iria ir contra um prefeito que foi eleito 4 vezes pela população. Além do fato dessas contas serem de 2018 e, mesmo assim, as pessoas votarem nele de novo em 2020. Então eu vejo que a população de Araraquara aprovou as mudanças que foram feitas na prática pelo prefeito Edinho. Quando se fala que tem os precatórios, temos que lembrar que também existe uma dívida ativa da Prefeitura que tem praticamente o dobro de precatórios para receber do que tem para pagar. A realidade é que no momento da gestão, o prefeito tem que muitas vezes sair da parte técnica e partir para a operacional, pois muitas vezes tem que salvar vidas. É com esse olhar que com certeza eu vou contra o Tribunal, mesmo porque, o próprio TCE estava indeciso, pois a votação foi 2×1 pela reprovação das contas. Também acho que é muito difícil para o TCE depois de 4 ou 5 anos verificar as contas, acho que falta eficácia no próprio trabalho do Tribunal de Contas. Além do fato de que as justificativas do Executivo para cada apontamento me contemplaram. Vale ressaltar ainda que tem um grupo político que não pensa na cidade e que quer usar este momento da aprovação das contas pensando nas eleições”, declarou o presidente da Câmara, Boi à reportagem.
Julgamento político
Em sua defesa, o prefeito Edinho Silva alega que a celeuma criada em cima do assunto se deve à uma disputa política e, que a reprovação das contas da prefeitura não é algo novo ou irreversível. Ele lembra que o mesmo já ocorreu em governos anteriores dos ex-prefeitos Waldemar De Santi, Roberto Massafera e Marcelo Barbieri, e que nunca ocorreu a reprovação das contas pela Câmara de Vereadores de Araraquara. Caso ocorra a reprovação, será a primeira vez da história da cidade.
“Infelizmente, está havendo por parte dos partidos de oposição um movimento de reprovação das contas. Não podemos deixar que a guerra política coloque em xeque os investimentos realizados, principalmente na saúde, educação e amparo social a quem mais precisa. Os investimentos em saúde e educação ocorreram acima do mínimo exigido pela constituição, gerando déficit, mas também demonstrando a grande preocupação da nossa gestão com a qualidade das políticas públicas. Mesmo investindo em saúde, educação e programas sociais, o déficit orçamentário foi reduzido pela metade. O documento de avaliação das contas em momento algum questiona a moralidade e a ética na utilização dos recursos públicos. Ao contrário, nenhuma ilegalidade é apontada. Vale ressaltar que todos os índices da boa gestão foram cumpridos e a “nota” obtida pelo município quanto às questões fiscais foi “B”, mesmo com os apontamentos referentes aos déficits e o aumento do volume de precatórios. Todos os apontamentos do TCE são válidos e já estamos trabalhando para corrigir o que foi pontuado pelo órgão. O que não podemos aceitar é que se faça julgamento político das contas da prefeitura. As forças políticas que tentam desgastar o nosso trabalho são as mesmas que se mobilizaram contra as nossas medidas de enfrentamento à pandemia, que invadiram o Hospital de Campanha, que se mobilizaram contra a vacina, que não aceitam a vitória que o povo de Araraquara nos deu nas urnas, que não aceitam a democracia”, alegou o prefeito Edinho.