José Augusto Chrispim
Inaugurado em 15 de abril de 2004, o Centro de Ressocialização (CR) Feminino de Araraquara completou 17 anos na semana passada. De acordo com a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), o CR tem capacidade para abrigar 96 reeducandas.
Com a proposta de humanização da pena com objetivo de ressocializar, em seus 17 anos de existência, a unidade prisional já abrigou 1.482 reeducandas. Atualmente, a sua diretora é Ede Aparecida Mariano Rosolem, que ocupa o cargo pela segunda vez. Ela substituiu a ex-diretora técnica Jucélia Gonçalves da Silva. Já a primeira diretora da unidade foi a Dra. Marisa Fonseca Monteiro, que comandou o CR por 10 anos.
Nos primeiros cinco anos, o CR foi administrado através de uma parceria entre a SAP e a Ong APAC, que foi afastada em 2009. A partir daí, a FUNAP (Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel) ampliou os contratos de trabalho e a alfabetização das presas.
Ambiente positivo
A unidade possui o perfil de oferecer um ambiente penal positivo e humano, dentro do que estabelece a Lei de Execução Penal e seguindo em acordo com as Normas Domésticas e Internacionais dos Direitos Humanos, refletindo em índice de reincidência abaixo de 10%, o que demonstra a eficácia na proposta do CR em ressocializar.
Pilares
O regime condutivo à reinserção da reeducanda à sociedade está alicerçado em quatro pilares centrais: trabalho, educação, família e religião. No que diz respeito à mão de obra carcerária, o CR oferece serviços para suas custodiadas por meio de contrato firmado com a Prefeitura Municipal de Araraquara, empresas privadas e órgãos públicos. Entretanto, por conta da pandemia de Covid-19, essas atividades seguem suspensas a fim de evitar disseminação do vírus.
Também são oferecidos cursos profissionalizantes, palestras com temas variados, além do “Projeto Transformar”, quando as reeducandas desenvolvem polvos de crochê para bebês prematuros internados em unidades de terapia intensiva (UTIs) que funcionam em maternidades da cidade e região. Os polvinhos fazem com que os bebês não se sintam sozinhos na incubadora e consigam, com isso, uma boa evolução no tratamento.
Em relação aos estudos, 46 reeducandas cursam os ensinos Fundamental e Médio, o que significa que todas as presas do CR que não têm os ensinos Fundamental e Médio completos estão estudando, no momento.
A unidade conta, ainda, com acervo de 2.515 livros. Durante o mês de fevereiro, por exemplo, houve o registro de 203 empréstimos de obras literárias por parte das internas.
Pandemia
Um dos pontos chaves dos CRs, inclusive, é o engajamento consciente da família, restabelecendo vínculos. Para tanto, o CR Feminino de Araraquara estabelece contato com familiares das presas, para fornecer todas as orientações sobre documentação necessária e dúvidas quanto à visitação. O estabelecimento penal estabelece, ainda, “pontes” entre a diretora de Segurança e os familiares, por telefone, para falar do convívio e das necessidades das internas.
Em meio à pandemia de Covid-19, todos os presídios do estado tiveram que se adaptar e inovar nas ações para manter o propósito de ressocialização dos reeducandos e manutenção dos vínculos familiares.
Uma das alternativas para driblar o distanciamento social foi a implementação do projeto Conexão Familiar, que busca agendar contato à distância por meio de visita virtual.
Isso só foi possível graças ao sistema de videoconferência implantado no presídios do estado, que já era utilizado para teleaudiências judiciais, além da realização de citações e intimações pelos Oficiais de Justiça e atendimento de advogados.
Entre as atividades voltadas para o fortalecimento espiritual das presas, o CR sempre manteve, antes da pandemia, a realização de cultos religiosos. Atualmente, com a crise de saúde imposta pelo novo coronavírus, as reeducandas se reúnem em sala de aula para ouvir os cultos religiosos pelo rádio, aos domingos.
Também são feitas rodas de oração no pátio, respeitando todos os protocolos de saúde envolvendo a Covid-19. O momento de louvor, inclusive, ocorre todos os dias.
A mais nova intervenção para trabalhar o lado espiritual das internas partiu de uma parceria entre o CR Feminino de Araraquara e o Instituto Ação pela Paz, que oferece curso de meditação visando novos projetos futuros.
Atividades culturais
A unidade foca, ainda, na realização de atividades culturais, entre elas, festas nas datas comemorativas, como Arraiá voltado para as presas e também servidores; e o tradicional Desfile da Primavera – eventos que seguem suspensos em razão da pandemia.
Porém, para não suspender totalmente as ações culturais, o CR Feminino de Araraquara promove a “Noite da Pipoca”, que consiste na exibição de um filme no pátio. A atividade é realizada de forma segura, respeitando o distanciamento entre as internas.
Perfil diferenciado
A filosofia de reabilitação do Centro de Ressocialização visa a reintegração social, isto é, a retomada do indivíduo preso à sociedade, com qualificações e recursos apropriados, para que a pessoa em questão se torne capaz de seguir estratégias para evitar a reincidência.
Esses recursos e qualificações são afetivos, como laços de família e autoestima incrementados; sociais, com foco na autoconsciência, capacidade de solucionar problemas e de negociar conflitos dentro de um grupo; e materiais, o que envolve dinheiro na conta em poupança, qualificação profissional e contatos no mercado de trabalho.
O CR, portanto, é um projeto que parte da concepção de acreditar na pessoa humana, com base no diálogo e humanização como instrumentos de mudança, para, desta forma, tornar possível construir uma nova pessoa.
Uma das servidoras mais antigas do Centro de Ressocialização Feminino de Araraquara, a Agente de Segurança Penitenciária (ASP) Ana Lucia Garcia Rigueiro confirma o perfil diferenciado dos CRs.
Ela, que atualmente é diretora de Segurança e Disciplina na unidade prisional, trabalha no CR Feminino desde a sua inauguração, antes mesmo de receber as reeducandas.
‘Projeto que funciona’
“Na minha opinião, [o CR] é um projeto que funciona. Passei por outra unidade antes de vir pra cá, mas aqui o tratamento humano é totalmente diferente”, relatou Rigueiro para a reportagem do O Imparcial.
Ela tem como hobby o crochê e aproveita a habilidade para ensinar o ofício às presas. “Muitas me procuram com interesse em aprender e isso aproxima a reeducanda do funcionário. Mostra que ela tem dignidade e não precisa ser julgada novamente por conta do erro que cometeu”, finaliza a servidora.