segunda-feira, 25, novembro, 2024

Nota Pública – Covid e atuação do MPT em Araraquara

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O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO tomou conhecimento, através dos meios de comunicação, de declarações prestadas pela Secretária Municipal de Justiça e Cidadania de Araraquara, Sra. Mariamália de Vasconcelos Augusto, a qual, a pretexto de justificar a realização de estudos sobre a mudança do regime jurídico dos funcionários da Prefeitura, formulou afirmações inverídicas a respeito da atuação do Ministério Público do Trabalho, acusando o órgão de provocar “problemas seríssimos de desassistência médica em várias regiões da cidade”. Com base nisso, o MPT vem a público prestar os seguintes esclarecimentos aos órgãos de imprensa:

– Na realidade, como revelado nas ações civis públicas n. 0010632-80.2020.5.15.0151 e 0010953-40.2020.5.15.0079, o Município de Araraquara tem desde o início da pandemia do Covid-19 se recusado a colocar a salvo todos os seus empregados pertencentes ao grupo de risco, pessoas que, de acordo com a ciência médica, são mais vulneráveis às piores consequências da nova doença, inclusive à morte, tais como idosos, diabéticos e portadores de doenças cardiorrespiratórias e imunossupressoras;

– Ao mesmo tempo, também desde o início da pandemia, o Município de Araraquara tem se recusado, apesar da insistência do Ministério Público do Trabalho, a buscar a contratação, temporária e excepcional, de profissionais em número suficiente para substituir, transitoriamente, as pessoas mais vulneráveis, integrantes do grupo de risco, do trabalho com risco de contaminação. Não realizando as contratações necessárias, o Município alega a carência de trabalhadores substitutos como justificativa para o não afastamento dos trabalhadores vulneráveis;

– Não por acaso, o Município já foi condenado pelo Poder Judiciário na primeira ação civil pública proposta, tendo sido reconhecido pela 3ª Vara do Trabalho de Araraquara que: “não foram efetivamente observadas as medidas de proteção dos trabalhadores mais vulneráveis, ou seja, aqueles idosos, de 60 a 70 anos, que também apresentam comorbidades”;

– Tal comportamento da Prefeitura Municipal já contribuiu ao falecimento de um socorrista do SAMU de Araraquara, trabalhador idoso, diabético e hipertenso, que pediu o afastamento do trabalho da linha de frente de enfrentamento da nova doença, e teve seu pedido negado, tendo sido mantido no trabalho até contaminar-se. Na decisão administrativa denegatória do pedido do trabalhador, aliás, a única explicação dada foi a de que “não haja déficit assistencial e administrativo” (déficit, como visto, criado pela Prefeitura ao não buscar contratações), não tendo sido feita qualquer menção ou análise da condição individual de saúde do trabalhador. Tivesse o trabalhador sido tempestivamente afastado, de trabalho em que mantinha contato com pacientes todos os dias, é possível que seu contágio e sua morte pudessem ter sido evitados;

– Descobriu-se, após o falecimento de tal trabalhador, que o Município havia, também, ocultado informações ao Ministério Público do Trabalho no inquérito civil em tramitação, tendo deixado de informar a respeito de dezenas de casos de trabalhadores, integrantes do grupo de risco, cujos pedidos de afastamento do trabalho foram denegados. Em nenhuma dessas decisões visualiza-se qualquer análise da condição individual de saúde dos trabalhadores requerentes, com as doenças de que eram portadores;

– Mostra-se, ainda, falsa a alegação feita pela Sra. Secretaria Municipal de Justiça, de que o MPT “fez isso porque agiu com base na CLT, uma legislação típica da iniciativa privada”. De fato, a necessidade de afastamento de trabalhadores do grupo de risco, mais vulneráveis, decorre de orientações da Organização Mundial da Saúde e da Portaria GM Nº 428, de 19 de março de 2020, do Ministério da Saúde, que se refere especificamente a servidores estatutários federais, servindo, entretanto, de parâmetro a ser seguido pelos demais entes da federação;

– É precisamente por conta de condutas negligentes à saúde e segurança do trabalhador, como as do Município de Araraquara, queo Brasil se tornou o recordista mundial de contaminações e mortes de profissionais da saúde por Covid-19, como revelado pelo Conselho Federal de Enfermagem, triste liderança que jamais poderia ser considerada “normal” ou “aceitável”, e que deveria mostrar a todos que algo precisa ser drasticamente corrigido, na forma como o país está tratando seus trabalhadores da saúde durante a pandemia;

– Mostram-se equivocados aqueles que sugerem que o cuidado com a saúde e segurança dos profissionais da saúde seria algo oposto ou incompatível com a manutenção do atendimento à população, como se os trabalhadores precisassem ser sacrificados para que a população não venha a ser prejudicada. Na verdade, a falta de cuidados com a saúde dos trabalhadores do setor é exatamente o que leva ao comprometimento do atendimento, seja pela perda (temporária ou definitiva) de profissionais qualificados, seja pela suspensão de atividades essenciais. Afinal, não há atendimento público à saúde sem profissionais da saúde sadios, em segurança, capazes de bem cumprir o seu papel;

– Por fim, o debate a respeito da alteração ou manutenção do regime jurídico celetista dos funcionários municipais de Araraquara há de ser conduzido pelo Poder Executivo, Poder Legislativo, trabalhadores e sociedade, sem interferência do Ministério Público – eis que tanto o regime celetista quanto o estatutário são admissíveis, do ponto de vista legal e constitucional – mas há de se lamentar e rejeitar que tal debate seja contaminado pela prestação de informações falsas ou equivocadas à população, com relação à atuação ministerial.

 

Redação

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